Tribunais

Presidente do STJ diz que diligências e julgamentos à distância não podem ser regra na Justiça

Notícias de Coimbra com Lusa | 2 anos atrás em 21-10-2021

O presidente do Supremo Tribunal de Justiça defendeu hoje que “o trabalho remoto e a virtualização de conferências e julgamentos”, através das tecnologias, “não podem constituir a regra” na justiça, alertando ainda para a degradação das instalações dos tribunais.

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“Não podemos querer uma justiça com tribunais transformados em locais ermos, ocupados por máquinas que se encarregam de trazer e fazer chegar aos destinatários as notícias sobre o desenvolvimento dos processos, com juízes e funcionários sistematicamente ligados a écrans nos mais diversos locais”, disse Henrique Araújo, que preside também, por inerência, ao Conselho Superior da Magistratura (CSM).

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O presidente do Supremo (STJ) discursava na abertura do XV Encontro do CSM, este ano subordinado ao tema “A (Des)Humanização da Justiça – Tecnologia como meio e não como fim”, assunto que Henrique Araújo classificou de “ingente atualidade”.

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O juiz conselheiro do STJ reconheceu que durante a pandemia do covid-19 a utilização das tecnologias e das plataformas audiovisuais Webex, Teams e Zoom – que possibilitaram a comunicação à distância – foi “indiscutivelmente útil”, “positivo” e “determinante” para a atividade dos tribunais, mas tal “não pode servir de pretexto para mudar radicalmente” o modelo de funcionamento dos tribunais.

“É nos tribunais, espaços físicos, que se faz a Justiça. É aí que os juízes exercem a função jurisdicional. É aí que se manifesta um dos poderes soberanos do Estado. A presença do juiz no tribunal transmite confiança e segurança aos cidadãos através da perceção da autoridade que dele emana enquanto titular de um órgão de soberania”, argumentou.

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Quanto às audiências de julgamento, em particular, Henrique Araújo referiu que “não se descortina como é que a sua realização à distância pode dar cumprimento aos princípios da publicidade, da oralidade e da imediação”, uma vez que “sem a interação pessoal, direta e imediata dos vários intervenientes, própria da dinâmica do julgamento, é difícil atingir uma decisão justa e equitativa”.

Sem questionar certas vantagens da informatização e da digitalização dos processos, o juiz conselheiro entende que daí também deriva “perigo real de funcionalização” da magistratura judicial.

“A generalização da via virtual na atividade judiciária acabaria por dar força àqueles – felizmente poucos – que não desistem de ver definitivamente abolida a independência do poder judicial e dos tribunais”, acentuou.

Henrique Araújo apontou as conclusões do estudo realizado pelo Grupo de Reflexão (CSM e Associação Sindical dos Juízes Portugueses) segundo as quais “a possibilidade de tramitação processual à distância não deverá significar uma total deslocalização física do juiz da Casa da Justiça, mostrando-se o exercício pleno e em condições de normalidade da função jurisdicional incompatível com o regime exclusivo ou quase-exclusivo de teletrabalho”.

Assim, expressou, serão “as circunstâncias de cada caso (judicial) que vão enformar o juízo de oportunidade sobre a realização de diligências e audiências à distância, sempre com balanceamento dos interesses em jogo, sempre com equilíbrio e bom senso, sempre como mera alternativa excecional”.

Por outro lado, adiantou, a aposta que tem vindo a ser feita nas tecnologias digitais deverá ser acompanhada da melhoria das condições físicas dos tribunais.

“Não é aceitável, ou melhor, parecerá contraditório, dispormos de tecnologias muito avançadas em tribunais degradados ou instalados em estruturas teimosamente provisórias, sem as mínimas condições de dignidade e conforto”, vincou.

O juiz conselheiro salientou que este encontro anual do CSM permitirá refletir sobre as vantagens e desvantagens do uso das novas tecnologias nos tribunais e apontar caminhos para uma justiça que, “não renegando a modernidade e o avanço tecnológico, se aproxime mais dos cidadãos em vez de se distanciar deles”.

“Nessa reflexão será também considerada a utilização pelo sistema judicial da inteligência artificial, nova ferramenta da revolução tecnológica e digital, cuja aplicação ao sistema judicial deve ser objeto de rigorosa apreciação”, disse ainda.

Apesar de não integrar a temática do encontro, Henrique Araújo aproveitou para lembrar que uma das competências do CSM é agir no campo disciplinar, investigando e, se for caso disso, sancionar condutas de juízes desrespeitadoras dos deveres funcionais a que estão adstritos.

Nessa tarefa – realçou – o CSM tem contado com a “total disponibilidade de juízes conselheiros jubilados que, prescindindo da tranquilidade do estatuto da jubilação, têm instruído processos de averiguações e disciplinares relacionados com situações funcionais complexas e de grande impacto público”, sem identificar nenhum caso em concreto.

Henrique Araújo agradeceu o trabalho desses juízes jubilados e apelou para que “continuem na infindável tarefa de dignificação da justiça portuguesa”.

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