Coimbra

Casa da Escrita está nas mãos de “meia dúzia de habilidosos”

NOTÍCIAS DE COIMBRA | 10 meses atrás em 12-07-2023

O Partido Comunista Português (PCP) de Coimbra convocou uma conferência de imprensa na sua sede, na Rua Adelino Veiga, para divulgar um conjunto de posições culturais para a cidade.

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Para Francisco Queirós, vereador na Câmara Municipal de Coimbra (CMC), a Casa da Escrita “é fundamental para promover a cultura”. Foi adquirida pela sua história, como espaço privilegiado para ser um equipamento público dedicado à promoção da escrita, do livro e da leitura.

No entanto, frisa o político, é necessária “uma programação para o espaço”, pois “sabemos muito pouco sobre o seu futuro”. “É importante saber a missão para aquele espaço […] porque temos joias na mão e desaparecem”, frisa.

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“É necessário um trabalho político de organização do tecido cultural de Coimbra”, uma vez que as iniciativas que decorriam no espaço “não precisam que venha um salvador dizer como é que Coimbra vai orientar a sua discussão sobre a escrita. E passar para a posse da Lusofonia ou de qualquer coisa, assim é que é muito redutor”, porque a Casa da Escrita “é uma estação da cultura de Coimbra”, afiança Manuel Rocha.

O PCP sugere uma programação para este espaço que inclua: “a divulgação e o acesso ao espólio de livros existente (coleção original e colecção Eduardo Lourenço), residências de criação literária de escritores com obra publicada, mas também de novos escritores, assumindo o apoio à criação literária como um dos desígnios do espaço; encontros de escritores com leitores, com a realização de cursos/laboratórios de escrita, para vários públicos e faixas etárias; visitas de escolas, com actividades pedagógicas ligadas à escrita e à leitura; lançamentos de livros; clubes de leitura e a abertura de uma livraria, aliás anunciada aquando da inauguração”.

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Não foi por acaso que Eduardo Lourenço chamou a este espaço um ‘Castelo de Sonhos’ e optou por doar a este local 3.000 livros da sua coleção individual, algo que o Presidente da Câmara Municipal de Coimbra, José Manuel Silva, entende ser “redutor”, acusa o partido comunista.

Consideram por isso, “que qualquer associação que seja exterior ao poder autárquico, esse empoderamento, essa posse, deveria ser dada com base num trabalho e numa programação”. “Não precisamos de uma casa enfiada numa temática, cidadania e da língua, mas precisamos é de uma Casa de Escrita”, afirma o deputado municipal Manuel Rocha.

Recorde-se que, no dia 1 de julho, o presidente da autarquia conimbricense afirmou que a Casa da Escrita ia “virar” Casa da Cidadania da Língua.

José Diogo, presidente da Direção da Associação Portugal Brasil 200 anos (APBRA), tem-se apresentado como programador e curador do espaço e até faz questão de propagandear o que a situação tem escondido da oposição,

A Casa tem uma função, uma prática anterior. Não precisa de um salvador para fazer da Casa da Escrita não mais do que o seu salão de festas. Não é um salão de festas é uma estação da cultura de Coimbra”, lamenta o PCP.

Francisco Queirós conta que é do “desconhecimento total dos órgãos autárquicos a entrega com curadoria e sede para uma associação fazer” algo que desconhecem. “Vamos à página da associação e a leitura, a escrita e a literatura não aparecem lá”. Colocando mesmo a questão: “Não sabemos qual a missão e o que aquela gente quer fazer ali. Podemos desconfiar?”.

O problema é que “todas as outras instituições que gerem equipamentos municipais têm uma história, uma missão, um objetivo que é claro. Fazem teatro, produzem arte e disponibilizam-na. Conhecemos, sabemos. Relativamente a esta  (APBRA) não sabemos nada disso”, questiona o vereador da CMC.

“Não conhecemos a associação. Ela não existe no nosso panorama. Ela é, digamos, uma boa ideia de meia dúzia de habilidosos. Não sabemos o papel da instituição naquele espaço”, afiança Manuel Rocha.

Para o vereador Francisco Queirós, “há todos os motivos para a cidade se questionar se não há confusão quando o presidente da Assembleia Geral da instituição é irmão do presidente da Câmara de Coimbra”.

Manuel Rocha prossegue com a ressalva de não podermos “fazer com a Casa da Escrita o que se faz com terrenos da cidade de Coimbra que são cedidos por não sei quantos anos para uma exploração qualquer que ninguém sabe qual é, com negócios que ninguém sabe definir”, por isso entendem que estes equipamentos não devem ser considerados “como produtos vendáveis a qualquer associação que apareça e que tenha bons contactos”.

“A Casa da Escrita ser entregue a figuras parece-nos uma má ideia”, refere Manuel Rocha. O objetivo deve passar por “favorecer a escrita que é um instrumento de cultura e de educação e um local onde Eduardos Lourenços confiam o seu espólio. É de tal forma dignificante que não permite qualquer jogada de antecipação comercial que vá transformar uma escrita universalista numa qualquer cidadania que ninguém sabe bem o que é. O que é duvidoso”, defende o deputado municipal.

Estes dirigentes do PCP de Coimbra, não reconhecem “aqueles nomes nem sequer os rostos quanto mais a sua existência no tecido cultural de Coimbra. Pouco ou nada a ver com a missão da Casa da Escrita”, asseguram.

“Fui ver os nomes das pessoas que integram a associação (APBRA) e parece que não há qualquer ligação. Uma é influencer digital, um é produtor e outro é empreendedor do imobiliário. É uma coleção de personalidades em que não vejo qualquer ligação à missão do equipamento cultural em Coimbra”, assevera Manuel Rocha.

Recordamos que José Manuel Silva disse no 3 de julho, que o protocolo com a Associação Portugal Brasil 200 anos (APBRA) para transformar a Casa da Escrita na Casa da Cidadania da Língua será feito “de acordo com a lei”, no entanto, continua a esconder os pormenores do negócio que acordou com a associação fundada por um irmão e por um amigo.

A APBRA afirma ser “uma Associação não governamental e sem fins lucrativos, dedicada ao desenvolvimento das relações humanas e económicas entre Portugal e o Brasil e à promoção cultura e da língua portuguesa, através da realização de eventos e parcerias com agentes privados e públicos dos dois países”.

A organização foi constituída em 26 novembro de 2021 num cartório de Lisboa, e tem como fundadores José Diogo (presidente da Direção), João Gabriel Silva (irmão do presidente da Câmara e líder da Assembleia Geral) e Maria Santiago (advogada na capital e presidente do Conselho Fiscal).

Quanto ao Convento São Francisco a dúvida é a mesma: “Qual a missão, programação e apresentação do modelo de gestão?”, pois na opinião de Francisco Queirós “devia ter um programa para mais anos”.

Conhece-se agora a nomeação de um novo responsável pela programação do Convento de São Francisco, mas
o espaço continua sem programa, como se conclui da garantia dada pela CMC de que o equipamento terá uma
identidade programática “definida, diferenciadora e impactante.” O mesmo é dizer: continuam por definir o modelde gestão e a missão daquele equipamento municipal, contrariando um dos inflamados compromissos pré e pós-eleitorais do actual Presidente.

No entender do PCP, qualquer modelo de gestão que venha a ser encontrado para o Convento de S. Francisco,
tem de assegurar a natureza pública do financiamento e da gestão daquele espaço, mas recusamos que a falta
de definição do dito modelo de gestão seja pretexto para manter e perpetuar a precariedade dos trabalhadores,
devendo proceder-se no imediato, à regularização dos vínculos e condições de trabalho da equipa necessária ao
seu funcionamento.  

Manuel Rocha afirma que a cidade “produz muita cultura” e no que diz respeito, ao Teatro Sousa Bastos, este é “um equipamento municipal necessário” e “estar na posse da Câmara Municipal é estar na posse de todos”.

O PCP valoriza e é favorável à posse administrativa do imóvel do antigo Teatro Sousa Bastos, para que
finalmente se possa avançar com a sua reabilitação. Em 2017, aquando da aprovação do projecto de arquitectura
submetido pelo promotor, foi também aprovada a aceitação de cedência para o domínio privado do Município de
uma área de 724,30m2 destinada a atividades culturais. Já então o PCP alertou para que a função e o destino a
dar à área cedida eram (e continuam a ser) muito vagos. Torna-se assim premente uma reflexão pública e uma
discussão alargada sobre o que fazer daquele espaço, que envolva os agentes culturais, designadamente, e não
só, o Conselho Municipal de Cultura.

“Quando falamos na marca de Coimbra estamos a vender a metro quadrado aquilo que é o nosso património, o que é um erro, porque degrada e porque não põe a tónica no que é essencial: o acesso da população e fruição dos equipamentos”, conclui.

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