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Museus de todo mundo querem ser pontes para unir “um mundo a ruir”

Notícias de Coimbra com Lusa | 3 anos atrás em 18-03-2021

Diretores de museus de todo o mundo sublinharam hoje o seu papel como pontes para unir “um mundo a ruir”, através de um equilíbrio entre o digital e o presencial num futuro “novo normal”.

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Num debate ´online´ promovido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), responsáveis de museus na Alemanha, Rússia, Colômbia, México e Reino Unido, entre outros, discutiram o impacto da pandemia na transformação das instituições museológicas e as condições necessárias para manterem a sua missão na preservação do património, locais de encontro, partilha e mediação cultural.

O presidente do Conselho Internacional de Museus (ICOM na sigla em inglês), Alberto Garlandini, recordou o diagnóstico do impacto da crise pandémica no setor, baseado nos últimos dados recolhidos pela organização não governamental, segundo os quais, a nível global, 6% dos museus poderão encerrar e 30% forçados a reduzir os seus funcionários devido às dificuldades económicas provocadas pela perda de visitantes e de receitas.

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“Arriscamo-nos a perder o conhecimento precioso destes museus e dos seus profissionais, o que seria uma catástrofe”, alertou o responsável, apontando que, se há museus de alguns países que reabriram, com limitações, muitos continuam encerrados e “o regresso dos visitantes espera-se muito lento”.

Defendendo a necessidade de repensar a relação dos museus com as comunidades que servem, o presidente do ICOM sublinhou também a importância de “reafirmar os valores essenciais de preservação, pesquisa e comunicação sobre o património, mas também de desenvolvimento sustentável, qualidade de vida e coesão social”.

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“O maior desafio dos museus ainda está para vir”, alertou Garlandini, sobre “esta crise terrível”.

Os responsáveis partilharam, no debate as suas experiências ao longo de mais de um ano de pandemia, as lições aprendidas, e a forma como estão a olhar para o futuro na era pós-covid, propondo algumas soluções.

O diretor do Museu Hermitage, em São Petersburgo, na Rússia, Mikhail Piotrovsky, defendeu que estas entidades “devem ser vistas como pontes num mundo que está a ruir” com o impacto económico, social e cultural da pandemia.

“Os museus continuaram a funcionar, mesmo fechados, no ´online´, mas o problema é que esta é uma nova realidade, portanto é preciso responder ao desafio com exposições intelectualmente provocadoras, que sejam apelativas ao público crescente que tem possibilidade de aceder ao mundo digital”, disse, defendendo que “é preciso equilibrar o digital e o presencial”.

Piotrovsky propôs que se mostre ao público as coleções de arte de forma mais aprofundada, incluindo as reservas, “e levá-las ao debate público, nunca esquecendo que os museus são inclusivos, têm algo para todos, mas a arte e a cultura são um privilégio, que as pessoas devem valorizar, percebendo que tudo custa dinheiro”.

Na questão do financiamento, crucial nos dias de hoje, já que muitos museus vivem dificuldades de sobrevivência, o diretor do Hermitage falou na manutenção de uma perspetiva solidária: “Temos de aprender a vender melhor o nosso trabalho, para vários tipos de público. Os museus que podem captar financiamento devem apoiar aqueles que não o têm”.

Por seu lado, a diretora do Museu do Antigo Oriente Próximo, em Berlim, Barbara Helwing, falou da reabertura das instalações, esta semana, encerradas desde novembro de 2020, indicando que foi necessário fazer adiamentos na programação, e repensar atividades.

“A nossa situação é privilegiada porque somos apoiados pelo Governo, e não teremos de fazer despedimentos nem de vender peças como alguns museus estão a fazer”, disse, no debate, referindo que, no grupo de 15 museus estatais em Berlim, as receitas sofreram grandes quebras devido à falta de visitantes.

Helwing considerou a situação “uma boa oportunidade” para aprender, e criar novas formas de comunicação com o público, embora veja no ´online´ uma forma fórmula “impossível de substituir os museus como lugares de encontro”, fazendo um alerta para a necessidade de repensar se será de manter o turismo de massas e as exposições ´blockbuster´ ou caminhar para outras opções.

Por seu turno, Juliana Restrepo, diretora do Museu Nacional da Colômbia, em Bogotá, indicou que, com a falta de visitantes, foi necessário alterar as programações e as atividades educativas, procurando novos públicos no mundo digital: “As perdas são enormes por todo o lado, mas temos de manter a esperança num regresso”.

Já a diretora dos Museus do Vaticano, Barbara Jatta, disse, no debate, que todos os funcionários daqueles espaços, e seus familiares, foram vacinados para se protegerem do vírus, mas “o momento é muito difícil, porque a dependência das receitas de bilheteira é total”.

“Voltámo-nos muito para o trabalho digital, mas, a longo prazo, este universo não pode substituir a presença dos visitantes”, comentou, apontando que, atualmente, estão a aproveitar o encerramento com trabalhos de manutenção.

Antonio Saborit, diretor do Museu Nacional de Antropologia do México, na Cidade do México, salientou que o processo de digitalizar as coleções “ajudou a abrir mais os museus ao mundo, e vai ajudar a manter esse contacto, se os profissionais aprenderem a tirar o máximo partido deste universo digital”.

“O museu é a instituição mais democrática que há, porque não exige nenhum perfil aos seus visitantes. Esta postura dá-nos uma responsabilidade acrescida para com o património que guardamos e exibimos”, sustentou.

Saborit disse ainda que o impacto da pandemia e a forma como os museus reagiram pode ser muito pedagógico: “Este processo pode ensinar-nos muitas lições, porque mais tarde ou mais cedo vamos ser absorvidos pela nova normalidade, e vamos esquecer rapidamente as reflexões. Portanto devemos trabalhar juntos para as colocar em prática”.

Deborah Mack, diretora do Museu Nacional de Arte Africana Smithsonian, em Washington, nos Estados Unidos, revelou que aquela entidade está a trabalhar “interna e externamente, a ouvir o público e os parceiros, para perceber como a atividade pode ser melhorada” ao nível do debate sobre a justiça racial, ética e social, temas na ordem do dia nos Estados Unidos.

“Nós acreditamos que temos de manter um diálogo muito próximo com o público. Temos de ser essenciais à sociedade, para isso estamos ligados ao meio educativo, professores, escolas, jovens, cuidadores, para descobrir que serviços e programas temos de providenciar”, indicou.

Lazare Eloundou Assomo, diretor do departamento de Cultura e Emergências da UNESCO, fez, na abertura do seminário, um diagnóstico do setor, descrevendo uma situação “frágil em tempos instáveis”, que, na “ausência de uma solução única milagrosa”, exige a partilha de experiências sobre a pandemia, para descobrir “como podem os museus continuar a servir a sociedade”.

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