O político Venâncio Mondlane foi acusado pelo Ministério Público moçambicano de cinco crimes, no âmbito das manifestações pós-eleitorais, incluindo incitamento à desobediência coletiva e instigação ao terrorismo, revelou o próprio, à saída da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Perante um forte aparato policial, com a sede da PGR, em Maputo, interdita à circulação automóvel e pedonal, e com elementos do Ministério Público a receberem-no à entrada com coletes antibala, o ex-candidato presidencial explicou, após 30 minutos no interior para receber a notificação, que vai para julgamento, com o apoio de uma “equipa internacional” de advogados, de “consciência tranquila”.
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Mondlane revelou que está acusado de um crime de apologia pública ao crime, de um crime de incitamento à desobediência coletiva, um crime de instigação pública a um crime, um crime de instigação ao terrorismo e um crime de incitamento ao terrorismo, acusação que não reconhece.
“Pelo contrário, eu prestei um grande serviço a esta nação. É a primeira vez em 30 anos de democracia em que nós conseguimos levar até ao extremo a questão de desvendar, tirar o véu da fraude. Tiramos a máscara da fraude e levamos até a extrema resistência contra um regime ditatorial que se mantém com base nas armas, com base nos assassinatos e nos sequestros”, disse aos jornalistas Venâncio Mondlane, que não reconhece os resultados das eleições gerais de 09 de outubro.
“Eu prestei um grande serviço a este país. E não só. É a primeira vez desde a independência nacional que o povo moçambicano durante uma semana canta o hino nacional e sente o sentimento pátrio, sente que pertence a uma pátria, sente que tem orgulho de ser moçambicano, tudo isto para mim configura um grande serviço prestado à pátria”, afirmou ainda, aludindo aos vários meses de protestos pós-eleitorais em Moçambique.
Nas declarações, acusou a Justiça moçambicana de ser “seletiva”, no tratamento deste processo: “É uma Justiça para aqueles que são conformados com o crime, que são promotores desse mesmo crime, recebem privilégios. E aqueles que querem combater esse crime, aqueles que querem combater esse estágio de miséria em que o país se encontra, são combatidos, são perseguidos, são presos, são mortos, são feridos”.
O trânsito na avenida Vladimir Lenine, na baixa da cidade e único acesso à sede da PGR, foi fechado cerca das 09:00 (menos uma hora em Lisboa), após terem sido posicionados meios de dissuasão da polícia na zona, como um tanque de água, e algumas dezenas de agentes, incluindo da Unidade de Intervenção Rápida e brigadas cinotécnicas, que impediam a aproximação de apoiantes de Venâncio Mondlane à PGR.
A polícia de choque formou mesmo um cordão de segurança à volta da sede da PGR e obrigou populares a retirarem-se da zona, ficando apenas jornalistas.
“Estes senhores polícias que vocês veem aqui, que estão a disparar contra os outros, são exatamente as pessoas que nós, quando apresentamos o nosso programa de governação, demos as melhores condições técnicas, salariais, de formação, de dignidade, que nunca tiveram 50 anos (…). Ainda vou sair daqui hoje, vão-me seguir, talvez vão continuar a disparar, vão matar algumas pessoas, vão ferir, mas esses são objetos do meu projeto”, afirmou Mondlane, depois de na segunda-feira a polícia ter feito disparos de gás lacrimogéneo em Maputo, após a sua chegada ao aeroporto, para dispersar apoiantes.
Garantiu ainda que a partir de hoje vai trabalhar na defesa, com o apoio de advogados moçambicanos e estrangeiros, precisamente no dia seguinte a ter regressado a Moçambique após várias semanas na Europa, em Portugal e na Alemanha: “Eu não fui à Europa, por acaso. Tenho advogados de todos os quadrantes”.
Venâncio Mondlane foi hoje chamado à PGR, pela terceira vez, no âmbito dos processos das manifestações pós-eleitorais, tendo o Ministério Público mantido o Termo de Identidade e Residência ao político, como medida de coação, segundo disse o político, à saída.
Moçambique viveu desde as eleições de outubro um clima de forte agitação social, com manifestações e paralisações convocadas por Mondlane, que rejeita os resultados eleitorais que deram vitória a Daniel Chapo, apoiado pela Frelimo, partido no poder, como quinto Presidente da República.
Segundo organizações não-governamentais que acompanham o processo eleitoral, cerca de 400 pessoas morreram em resultado de confrontos com a polícia, além de destruição de património público e privado, saques e violência, conflitos que cessaram após encontros entre Mondlane e Chapo em 23 de março e em 20 de maio, com vista à pacificação do país.
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