Tudo começou com uma proteína que não devia estar ali. A α-lactalbumina é uma proteína produzida durante a lactação, essencial para a produção de leite nas mulheres.
Contudo, há décadas que os cientistas notaram algo estranho: essa mesma proteína surgia em tumores do tipo mais agressivo de cancro da mama — o cancro de mama triplo-negativo (TNBC), que evita tratamentos hormonais e se espalha rapidamente.
Agora, uma vacina pioneira, desenvolvida pela Anixa Biosciences em colaboração com a Cleveland Clinic, está a mostrar resultados promissores em testes iniciais. O objetivo é simples e revolucionário: treinar o sistema imunitário para identificar e atacar a α-lactalbumina presente nestes tumores, prevenindo o desenvolvimento do cancro.
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“Se isto funcionar e conseguir prevenir o cancro, talvez possamos erradicar o cancro da mama enquanto doença,” afirmou Amit Kumar, CEO da Anixa Biosciences, ao The New York Post.
Esta proteína normalmente só está presente no corpo de mulheres a amamentar, mas pode ser encontrada em até 70% dos casos de TNBC. Assim, o sistema imunitário pode atacar esta proteína ‘estranha’ sem danificar os tecidos saudáveis.
Numa fase 1 do estudo, envolvendo 35 mulheres com TNBC em estágio inicial ou com risco genético, mais de 75% desenvolveram uma forte resposta imunitária, produzindo anticorpos e células preparadas para reconhecer a α-lactalbumina. Os efeitos secundários foram ligeiros, com apenas uma irritação leve no local da injeção.
Ao contrário das vacinas tradicionais contra infeções, as vacinas contra o cancro enfrentam o desafio de convencer o sistema imunitário a atacar células próprias do corpo — tarefa difícil porque o sistema é treinado para as ignorar. A vacina contra a α-lactalbumina ultrapassa este obstáculo, focando-se numa proteína que só devia estar presente durante a amamentação, tornando-a um alvo seguro.
Este conceito foi inicialmente proposto há cerca de 20 anos por um investigador da Cleveland Clinic. Agora, começa a tomar forma real com esta vacina administrada em três doses, com intervalos de duas semanas.
Estudos em animais já demonstraram que a vacina impede a formação de tumores, e os testes em humanos prosseguem com otimismo cauteloso. Os ensaios de fase 2 estão planeados para o próximo ano, envolvendo mais participantes e abrangendo outros tipos de cancro da mama para além do TNBC.
Apesar dos avanços, a vacina enfrenta ainda muitos desafios, incluindo a necessidade de ensaios clínicos mais amplos que confirmem a proteção real, e a obtenção de financiamento para prosseguir o desenvolvimento.
O cancro de mama triplo-negativo afeta cerca de 14 em cada 100.000 mulheres nos EUA e tem uma taxa de sobrevivência inferior a outros tipos, sendo difícil de tratar e com elevada probabilidade de recidiva.
“Esta vacina representa um avanço empolgante e é única no seu objetivo de prevenir o TNBC, que pode ser mais difícil de tratar devido à falta de terapias direcionadas,” comentou a Dra. Rima Patel, oncologista do Mount Sinai.
Se confirmada, esta vacina poderá transformar o combate ao cancro da mama, atuando preventivamente e ensinando o sistema imunitário a detetar o cancro antes que ele se instale — uma verdadeira revolução na medicina.
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