Um aumento de 10% na dotação do ensino superior na próxima legislatura, menos burocracia e mais agilidade administrativa e autonomia foram algumas necessidades apontadas hoje por reitores, e não só, para as instituições de ensino superior.
O painel dedicado ao financiamento das instituições fechou, em termos de debate, o Encontro Nacional do Ensino Superior 2030, que hoje decorreu no ISCTE, em Lisboa, e o reitor da Universidade de Lisboa, António Cruz Serra, convidado a moderar uma mesa com cinco intervenientes, acabou por subverter o seu papel e ser o sexto elemento do painel, defendendo que, contra o subfinanciamento que as instituições vivem, é preciso aumentar a dotação do ensino superior em, pelo menos, mais 10% na próxima legislatura.
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E indo ao encontro do que minutos antes tinha sido defendido pelo presidente do conselho coordenador dos institutos politécnicos e presidente do politécnico de Setúbal, Pedro Dominguinhos – que classificou o nível de burocracia uma perda de tempo e de recursos – o reitor de Lisboa defendeu que “cada euro a mais no orçamento” das instituições poderia representar “mais dois ou três” se chegasse “acompanhado de mais agilidade administrativa e autonomia”.
No comentário final ao debate deste painel, o membro do Governo convidado, o secretário de Estado do Orçamento, João Leão, acabaria por dar razão às instituições nas duas questões, reconhecendo que nos próximos anos “é importante continuar o caminho de simplificação administrativa”, não só no que diz respeito aos fundos europeus, mas também à contratação pública, sendo também “muito importante reforçar os mecanismos de autonomia financeira”, reconhecendo ainda grande responsabilidade financeira às instituições de ensino superior, o que as coloca em melhores condições para “poder beneficiar de um conjunto de mecanismos adicionais de flexibilização”.
Maria de Lurdes Rodrigues, reitora do ISCTE e anfitriã do encontro promovido pelo conselho de reitores (CRUP), manifestou na intervenção de conclusão o seu agrado com as palavras de João Leão, e já com o ministro do ensino superior, Manuel Heitor, sentado na mesa defendeu que é necessário pensar o modelo de financiamento assente em duas componentes congeladas: uma fórmula de financiamento que não é efetivamente aplicada e que tem por base a conjugação do número de alunos das instituições e a qualificação do corpo docente; e as propinas, a componente suportada pelas famílias, que iniciaram um caminho de redução, possivelmente em direção à extinção, de acordo com a vontade manifestada pelo Governo.
“É muito necessário que se clarifique qual vai ser a evolução destas regras para que as instituições possam ganhar confiança e capacidade de previsibilidade, adaptar as suas estratégias de desenvolvimento aos recursos disponíveis”, disse Maria de Lurdes Rodrigues.
João Leão defendeu no comentário ao painel sobre financiamento que “não podemos ter modelos de financiamento apenas baseados no histórico” e que o financiamentos das instituições deve evoluir para um modelo que, sem comprometer a estabilidade, dê incentivos às instituições para captarem mais alunos, para se tornarem mais inovadoras, com gradualismo, com sensatez, que dê os incentivos corretos para que as universidades queiram crescer”.
Sobre a fórmula de financiamento do ensino superior, Cruz Serra tinha defendido no painel que antecedeu a sessão de encerramento que o seu principal problema é não ser aplicada e que será muito difícil alterá-la. Já Pedro Dominguinhos alertou que criar qualquer nova fórmula de financiamento não pode significar “tirar a uns para dar a outros”; e a ex-ministra do ensino superior social-democrata Maria da Graça Carvalho defendeu uma nova fórmula, “com vetores” como o património das instituições, a sua localização, critérios relativos a investigação e ciência e incentivos à qualidade e excelência do trabalho das instituições, um modelo a fazer lembrar a fórmula que o ex-ministro Nuno Crato tentou implementar.
Sobre propinas a ex-ministra social-democrata manifestou a sua discordância em relação ao seu fim, como defendido por Manuel Heitor, sendo o financiamento do Estado aplicado no apoio aos alunos mais carenciados.
No polo oposto, a deputada do PCP Ana Mesquita defendeu uma completa revisão legal que elimine propinas e aumente o financiamento do Estado às instituições: “Parece-nos que não é uma coisa ‘do espaço’ que estamos a propor, são premissas que gostaríamos de ver discutidas”.
Mostrou-se ainda preocupada com a ideia de aumentar o peso do financiamento privado no orçamento das instituições, considerando que isso representa um perigo de dependência face a quem financia e de “mercantilização e perda de autonomia científica”.
Já o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), Gonçalo Leite Velho, que enfatizou que estão em falta 200 milhões de euros nos orçamentos das instituições para despesas com pessoal, questionou que pressão colocaria ainda a total eliminação de propinas, que podem representar a perda de mais 200 milhões de euros nas receitas das instituições.
Depois de no último painel do dia ter ouvido o secretário de Estado do Orçamento defender a importância dos alunos estrangeiros e da internacionalização do ensino superior para o seu financiamento, Maria de Lurdes Rodrigues disse que a internacionalização em Portugal tem um desafio específico, o da língua, da qual não pode simplesmente abdicar e adotar o inglês como ‘língua franca’ em todas as ofertas formativas disponíveis, uma vez que há um público específico dos países falantes de português que não pode ser ignorado.
“Precisamos de manter ofertas formativas em português e inglês. Isto exige um investimento, exige uma atenção e um olhar para que não contribuamos para a desvalorização da língua portuguesa e para que continuemos a ser de certo ponto de vista um farol para os países de língua portuguesa, que contam connosco. Nós temos que nos internacionalizar, mas a nossa internacionalização faz-se em dois caminhos, que têm que ser paralelos”, disse.