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 Universidade de Coimbra cria instrumento para melhorar a qualidade do apoio durante o luto

Notícias de Coimbra | 12 horas atrás em 29-07-2025

Imagem: Ana Bartolomeu

Uma equipa de investigação, liderada pela Universidade de Coimbra (UC), desenvolveu e testou em Portugal um inquérito que permite avaliar a qualidade do apoio prestado por serviços de saúde durante o luto. Com os resultados positivos deste estudo-piloto, as investigadoras acreditam que este instrumento pode contribuir para melhorar a prestação deste acompanhamento, e, assim, ajudar as pessoas a lidar com a perda.

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A equipa da UC conduziu esta investigação com o objetivo central de “compreender a experiências dos familiares de quem faleceu em relação ao apoio prestado, incluindo dificuldades que tenham tido em aceder e receber apoio, tanto pelo próprio serviço de saúde, como por outros recursos disponíveis na comunidade”, revela a investigadora da Faculdade de Medicina da UC (FMUC), Maja de Brito.

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Por norma, “os inquéritos habitualmente utilizados nos serviços de saúde centram-se na avaliação da satisfação com o serviço, mas este inquérito que desenvolvemos propõe uma abordagem diferente, ao focar-se em múltiplas dimensões da qualidade do apoio no luto”, contextualiza a também psicóloga clínica.

Neste âmbito, o instrumento desenvolvido “abrange todos os níveis de apoio, desde os cuidados especializados até ao apoio informal, oferecendo uma imagem completa do ecossistema de apoio ao luto ao qual as pessoas enlutadas recorrem”, avança a investigadora da Universidade de Coimbra. “Este mapeamento ajuda a identificar quem são os agentes de apoio numa determinada comunidade e, com isso, favorece a criação de redes de colaboração mais eficazes entre hospitais, cuidados primários, serviços especializados e comunidade. Deste modo, o inquérito contribui para melhorar a continuidade dos cuidados, uma das principais fragilidades apontadas no apoio ao luto a nível global”, acrescenta.

Em concreto, como revela Maja de Brito, “a utilidade do apoio recebido (ou seja, até que ponto a pessoa sentiu que o apoio ajudou ou mudou algo para melhor), as preferências de apoio (os tipos de apoio que a pessoa gostaria de ter recebido, mas que não estavam disponíveis, seja por razões práticas/logísticas ou porque não existem atualmente), o acesso ao apoio (como foi procurado, como se acedeu, e se existiram obstáculos), e as barreiras ao apoio (porque é que, mesmo havendo necessidade e vontade de receber apoio, algumas pessoas não conseguem obtê-lo)” são alguns dos pontos-chave deste inquérito que criado e testado pela equipa liderada pela UC. 

O inquérito foi implementado junto de familiares de pessoas diagnosticadas com cancro que receberam cuidados no Serviço de Medicina Paliativa da Unidade Local de Saúde de Santa Maria. Participaram 20 pessoas, que tinham perdido um dos progenitores, filho, parceiro ou irmão há mais de um ano.

A equipa de investigação revela que, para os familiares, “responder ao inquérito foi vivido como uma oportunidade valiosa de: 1) contribuir para a produção de novo conhecimento e, assim, ajudar outras pessoas; 2) ter as suas experiências ouvidas e reconhecidas, com o objetivo de melhorar os serviços de apoio no futuro; 3) ajudar a quebrar um tabu social, a dificuldade em falar abertamente sobre a morte e o luto; 4) prestar homenagem ao familiar falecido”.

Maja de Brito sublinha o papel dos serviços de saúde no acompanhamento durante um processo de luto: “esses serviços devem, pelo menos, realizar uma avaliação inicial das necessidades de apoio no luto e fornecer informação básica sobre o luto e os recursos disponíveis”.

Sobre as mais-valias deste inquérito para os serviços de apoio, a cientista explica que “quando utilizado de forma sistemática, pode ajudar os serviços a escutar e a aprender com o testemunho das pessoas enlutadas, melhorando a sua capacidade de resposta. Ao mesmo tempo, quando as pessoas sentem que a sua dor é reconhecida e que as suas experiências são levadas a sério, isso pode representar um passo essencial no seu processo de integração da perda”. 

Quanto a melhorias que podem ser originadas por esta escuta dos familiares, a investigadora adianta que “ao compreendermos melhor as necessidades e preferências de cada pessoa, podemos avançar para um modelo de apoio que não se limite à gestão da perda, mas que promova a criação de sentido, a resiliência e a ligação humana para que ninguém tenha de sofrer em silêncio”. Por exemplo, podem ser implementadas melhorias como “adaptação das vias de comunicação às preferências dos enlutados, para que a informação básica sobre o luto e apoios existentes possa chegar a todos; expandir a oferta de apoios – apoio em grupo, apoio baseado em atividades (caminhadas, expressão artística, entre outras atividades); disponibilidade dos serviços de apoio (horários, disponibilidade de apoio telefónico, por videochamada, reforço de recursos nas equipas psicossociais, entre outros)”, partilha.

“Este estudo parte da convicção de que o apoio ao luto é uma responsabilidade partilhada entre profissionais, serviços, comunidades e redes de proximidade para que os prestadores de apoio de diferentes setores se articulem melhor no acompanhamento de quem vive com uma perda”, sublinha Maja de Brito.

O inquérito pode ser aplicado em outros serviços de saúde, estando disponível em língua inglesa no artigo científico Surveying the quality of bereavement support within a service setting: A pilot study using cognitive interviewing with bereaved people, publicado na revista Palliative Medicine. Para acesso à versão em língua portuguesa, as entidades interessadas devem contactar a equipa de investigação da UC, através do endereço de e-mail. 

O estudo contou também com a participação de investigadoras do King’s College London, da Universidade de Bristol, da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e do ISPA – Instituto Universitário. Foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia e pela Fundação Calouste Gulbenkian, através do projeto DINAMO – Dinamizar formação avançada e investigação para otimizar os cuidados paliativos domiciliários em Portugal, liderado pela investigadora coordenadora da FMUC, Bárbara Gomes. 

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