Justiça

“Não sei” ou “não me lembro”. Professor de Coimbra diz que Ricardo Salgado dá respostas atípicas em doentes de Alzheimer

Notícias de Coimbra | 4 semanas atrás em 02-04-2024

Os peritos responsáveis pelo relatório que atestou a doença de Alzheimer de Ricardo Salgado defenderam hoje em tribunal que o ex-banqueiro mostrou um comportamento atípico nos testes periciais revelando “baixo esforço” nas respostas, conclusão que a defesa tentou descredibilizar.

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Ouvido hoje no âmbito do caso EDP, cujo julgamento prossegue no Campus de Justiça, em Lisboa, o psiquiatra do Instituto Nacional de Medicina Legal e professor da Universidade de Coimbra Joaquim Soares Cerejeira referiu que Ricardo Salgado respondeu por diversas vezes “não sei” ou “não me lembro” a várias questões colocadas no âmbito dos testes periciais a que foi submetido, o que é uma “resposta atípica em doentes de Alzheimer”.

“O doente de Alzheimer esforça-se por responder e muitas vezes responde de forma errada. Esse é que é o padrão”, disse o perito, insistindo que um “esforço baixo” para responder às questões não é o padrão da doença, nomeadamente em questões de âmbito familiar, como as colocadas em relação aos filhos.

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Os resultados neste teste foram usados pelos peritos para alegar uma eventual tentativa de exacerbamento de sintomas por parte de Ricardo Salgado, algo que o advogado de defesa do antigo banqueiro, Francisco Proença de Carvalho, procurou rebater, questionando o perito sobre outros fatores que possam explicar esse comportamento, tendo o psiquiatra concordado que flutuações cognitivas ou um maior nível de cansaço de Salgado naquele dia podiam ter influência nas respostas dadas.

Para além de sublinhar que o comportamento de Salgado pode ser explicado por “várias hipóteses”, Proença de Carvalho argumentou também que as conclusões do relatório desvalorizam outro teste realizado, cujos resultados contestam a ideia de baixo esforço do doente em exame.

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“Curiosamente eu não consigo perceber é como é que só se fez referência a um teste nas conclusões do relatório e não se fez referência a outro teste que demonstra precisamente o contrário. Isso é que não consigo compreender”, disse o advogado aos jornalistas, à saída da sessão de hoje.

Francisco Proença de Carvalho questionou ainda a parte da perícia realizada por uma psicóloga, e não por alguém especializado em neuropsicologia, como a doença imporia, argumentou, referindo que “é uma especialidade muito específica”.

Quer Joaquim Soares Cerejeira, quer a neurologista Maria Isabel Santana, defenderam as conclusões do relatório que apontam para que Ricardo Salgado tem condições para prestar declarações em tribunal, ainda que não possam garantir o rigor das respostas.

A defesa questionou “que consistência se pode retirar” das respostas de uma pessoa com doença de Alzheimer, incapaz de responder com correção a perguntas básicas como a sua idade, o dia, o mês e o ano em que está ou quem é o primeiro-ministro, tendo Maria Isabel Santana sublinhado que há uma diferença entre memórias mais recentes e memórias mais antigas, podendo ser do interesse do tribunal interrogar e ouvir as respostas sobre factos mais antigos.

Joaquim Soares Cerejeira, quando questionado sobre a capacidade de Salgado responder a questões complexas como as associadas à acusação, disse que a complexidade das perguntas deve ser adaptada à situação do interrogado, podendo ser necessário no caso de Ricardo Salgado decompor uma pergunta complexa em várias questões mais simples para permitir a resposta, e dar-lhe mais tempo do que o habitual para responder.

O psiquiatra referiu que os testes periciais apuraram que Salgado “não tem défices muito graves” na função cognitiva, sendo capaz de compreender perguntas complexas, sendo mais notória a dificuldade ao nível da memória, sobretudo a mais recente, tendo a defesa voltado a invocar a capacidade de Salgado de responder a perguntas simples como a sua idade.

“O que se percebeu é que, obviamente, num contexto de complexidade, esta pessoa, com esta doença, infelizmente, não tem a capacidade para responder às perguntas e para dar respostas com o mínimo de consistência. Portanto, na defesa da dignidade dele, que é o que vamos fazer sempre, (…) a defesa tem que o proteger de um interrogatório desse género”, disse o advogado aos jornalistas, referindo que os advogados não podem permitir que um cliente seu seja submetido “a um circo, a um vexame”.

Ricardo Salgado, ex-presidente do Grupo Espírito Santo, responde por corrupção ativa para ato ilícito, corrupção ativa e branqueamento de capitais.

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