A forma como os alimentos percorrem o intestino — seja a toda a velocidade, seja de forma mais lenta e tranquila — pode ter um impacto profundo na saúde humana, muito além do que se imaginava.
Uma revisão científica publicada em 2023 na revista Gut, que reuniu dezenas de estudos, concluiu que pessoas com trânsito intestinal rápido têm microbiomas intestinais muito diferentes daquelas com trânsito lento, e estas diferenças podem estar associadas a várias doenças.
O microbioma intestinal, composto por biliões de microrganismos que vivem no intestino, desempenha um papel fundamental no metabolismo, no sistema imunitário e até no funcionamento do cérebro. Esta nova investigação sugere que o tempo de trânsito intestinal — ou seja, quanto tempo as fezes permanecem no cólon antes de serem eliminadas — pode ser uma peça-chave para compreender alterações na flora intestinal.
PUBLICIDADE
Segundo os investigadores da Universidade de Copenhaga, um trânsito intestinal excessivamente lento tem sido associado a distúrbios metabólicos, problemas inflamatórios crónicos e até a doenças neurológicas como a Doença de Parkinson. Isto porque o tempo prolongado dentro do cólon permite que certas bactérias fermentem os alimentos por mais tempo, produzindo substâncias que podem afetar negativamente a saúde.
Por outro lado, um trânsito intestinal demasiado rápido limita a capacidade das bactérias de intervirem no processo digestivo, alterando o equilíbrio do microbioma.
A equipa analisou dados de milhares de pessoas saudáveis e de pacientes com doenças como síndrome do intestino irritável, constipação crónica e cirrose hepática. Para medir o tempo de trânsito intestinal foram usados vários métodos: desde sensores ingeríveis em cápsulas, até à conhecida Escala de Bristol, que classifica as fezes de acordo com a consistência.
Os resultados mostraram que:
- Pessoas com trânsito rápido têm microbiomas dominados por bactérias de crescimento acelerado, que preferem dietas ricas em hidratos de carbono.
- Pessoas com trânsito lento apresentam mais frequentemente bactérias que prosperam com proteínas.
- Em ambos os extremos, rápido ou lento, verificou-se menor diversidade microbiana, um fator associado a pior saúde intestinal.
Os investigadores acreditam que o trânsito intestinal pode criar um ciclo de retroalimentação: as bactérias dominantes produzem substâncias que perpetuam esse ambiente, mantendo o organismo preso a um ritmo intestinal específico.
O estudo sugere ainda que o tempo de trânsito intestinal pode explicar por que motivo duas pessoas que comem exatamente a mesma refeição podem reagir de forma completamente diferente. Pode também influenciar a eficácia de probióticos, suplementos e medicamentos que interagem com o intestino.
Reconhecer o “ritmo intestinal” individual pode, no futuro, permitir tratamentos mais personalizados, dietas ajustadas a cada pessoa e melhores diagnósticos.
“Precisamos de compreender melhor a relação bidirecional entre microbiota e tempo de trânsito intestinal”, concluem os autores. “Isso poderá ser essencial para prevenir, diagnosticar e tratar doenças do intestino e de todo o organismo.”
A investigação abre portas para uma nova abordagem na saúde digestiva, onde o tempo que os alimentos passam no intestino pode revelar mais do que nunca se imaginou.
PUBLICIDADE
PUBLICIDADE
