Opinião

Início, deixa-te ficar…

Notícias de Coimbra | 4 meses atrás em 04-01-2024

Início, fica por aqui; não bazes. Instala-te, bebe um copo e desfruta. Não há  pressa… o ano ainda agora começou e contigo tudo parece mais fácil, mais  simples e mais belo. 

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Tu és sempre melhor do que qualquer final. Aliás, és muito melhor. Muito  melhor do que os finais e até do que os desenvolvimentos. Por isso, fica por  aí. Aproveita e estica-te o máximo que conseguires. 

Não te quero deixar vaidoso, mas tu és mesmo maravilhoso, Início. A melhor  das companhias. Desde o começo da vida, enquanto nos transportas na  forma de bebés alheados do mundo, aconchegados em fraldas que  amparam cocós, concentrados apenas em ser alimentados e mimados,  quando uma simples caminhada nossa suscita aplausos e as mais efusivas  celebrações. Uma euforia que nunca visitamos no desenvolvimento, na  idade adulta, e que, no final, na velhice, facilmente é confundida com uma  condescendência geriátrica. 

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Início, traz-me o prelúdio do amor, quando ainda não existem vícios ou  defeitos. Quando até o nervosismo é saboroso e nos bastam os sorrisos  rasgados, beijos apaixonados e mensagens dedicadas para descobrir a  felicidade do quotidiano. Traz-me essa sensação inaugural, quando  acreditamos em amor sem sofrimento e sexo sem proteção. “Ela é amorosa;  é claro que não tem hepatite C!”, pensamos. Porra, como é leve a perspetiva  das doenças venéreas perante a força curativa do amor. E tudo por tua  causa, Início. 

Apresenta-me lá outra vez o início do trabalho, o regozijo do primeiro dia no  emprego, aquele que nos leva a pensar: “Isto é tão mais compensador do  que estudar”. Recupera o momento em que nos dás a conhecer as novas  instalações, os novos colegas, os novos processos e ferramentas de  trabalho, tudo explicado por uma voz bonita que nos faz crer que a  generosidade e a paz de espírito moram em todas as almas que doravante  se cruzarão no nosso caminho profissional. 

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Que saudades, Início, que saudades… que saudades de quando,  entusiasticamente, me introduzes a novas séries de televisão, à intensidade  dos primeiros episódios que antecipam 457 horas de ficção distribuídas por  14 temporadas. Quando me revelas novas histórias, originais, disruptivas,  em que o começo é sempre mais prazeroso do que o final – Game of  Thrones, desculpa mas ainda não te consegui perdoar. 

E os novos amigos, Início!? Como são bons e infalíveis os novos amigos!  Como é divertida a nova amizade, o período em que a tua lente filtra todos  os defeitos daquela pessoa extremamente agradável, com os padrões  morais e sentido de humor que idealizamos em qualquer ser humano.

Só tu, Início, meu bom companheiro, só mesmo tu para me fazeres olvidar  que o fim-de-semana só tem dois dias e que as férias hão-de acabar. Só tu  para me espetares um delírio desmedido à sexta-feira, mesmo sabendo que  o domingo chegará. 

Estou a ficar velho, Início. Talvez por isso, mesmo na alvorada do novo ano,  sinto-te já longe, a levar o entusiasmo que a minha esperança reclama, na  tentativa vã de não ser chacinada. 

Início, sua droga sádica e passageira, besta irresistível, porque desapareces  tu, sem aviso prévio ou beijo de despedida? Deixa o fim lá longe e fica mais  um pouco. Preciso de ti para gostar de tudo isto, Início.

Opinião | Bernardo Neto Parra

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