O plenário do parlamento retomou hoje, depois das férias do verão, com um confronto verbal violento que começou quando o presidente do Chega associou PS e PSD à corrupção por recusarem um inquérito sobre incêndios.
As várias intervenções de André Ventura e o barulho que elas provocaram forçaram o presidente da Assembleia da República a intervir várias vezes, chegando mesmo ao ponto de advertir que a sua paciência tem limites. Mas motivaram sobretudo respostas duras por parte dos líderes parlamentares do PSD, Hugo Soares, e do PS, Eurico Brilhante Dias.
Neste debate, o presidente do Chega, sabendo que o PSD concordava com o PS sobre a constituição de uma comissão técnica independente sobre incêndios – e que recusava a sua proposta de inquérito parlamentar -, defendeu então a tese de que sociais-democratas e socialistas estavam unidos para impedir o apuramento dos responsáveis pelos incêndios e de quem ganha com eles do ponto de vista dos negócios. E daqui partiu para acusações de 50 anos de corrupção e de “colinho” do PSD ao PS.
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Eurico Brilhante Dias interpretou a atuação “ofensiva” de André Ventura contra o PS e o PSD sobre a questão dos incêndios como uma estratégia no sentido de esconder algo, designadamente se o Chega tinha ou não recebido financiamento da empresa Helibravo, que estará a ser investigada. Sugeriu então que o presidente do Chega poderia ter “o rabo preso” nesta questão dos fogos florestais.
Na resposta, André Ventura, de forma sumária, negou que a sua força política tenha sido financiada pela empresa Helibravo. E devolveu que o PS é quem tem “o rabo preso” por causa de “Paulo Pedroso, Ferro Rodrigues, Manuel Pinho ou José Sócrates”. Disse, também, que dinheiro de empresas tem o PS “os bolsos cheios” desde o tempo do seu fundador, Mário Soares, falando então em dinheiros provenientes de Macau ou Angola.
O presidente do Chega afirmou até que Mário Soares, após o 25 de Abril de 1974, “mandou os colonos brancos para os tubarões”.
Após estas referências sobre o suposto percurso político de Mário Soares, o presidente da Assembleia da República lembrou o papel do antigo chefe de Estado em defesa do pluralismo político em Portugal, dizendo mesmo que André Ventura fala livremente “também por causa de Mário Soares” e da sua ação pela liberdade em vários momentos da história recente do país.
Tal como em relação ao PS, o presidente do Chega também visou o PSD, usando, por vezes, palavras violentas. Acusou os sociais-democratas de darem “colinho” ao PS, partido que disse representar “a corrupção”. E, dirigindo-se a Hugo Soares, disse-lhe que não tem medo do PSD e contrapôs que os sociais-democratas temem um inquérito parlamentar sobre os incêndios, porque assim “se descobriria quem ganha com incêndios”.
Da primeira vez, Hugo Soares respondeu a Ventura recordando-lhe que um elemento do Chega, de Vendas Novas, distrito de Évora, foi apanhado em flagrante a pegar fogo. Já do ponto de vista político, Hugo Soares acusou Ventura de estar a gerar um ambiente de “regabofe” no plenário, visando apenas alimentar redes sociais.
O presidente da bancada social-democrata queixou-se também do comportamento de André Ventura em vários debates parlamentares, assinalando que o líder do Chega se dirige a terceiros fazendo um gesto com a mão – um sinal aplicado a quem rouba.
“Não sei se ele está a mandar vir um hambúrguer Big Mac. Mas se ele está a acusar alguém, num gesto popular que significa subtrair, incendiar, colocar a legalidade em causa, é bom que André Ventura assuma as suas responsabilidades, porque para um candidato a Presidente da República não fica nada bem”, avisou.
O presidente do Chega reagiu, elevando o tom e o alcance das acusações. Apontou para um deputado do PSD, sentado na quarta fila da bancada, dizendo que esse deputado, enquanto autarca, atropelou uma criança com o seu carro. Uma afirmação que indignou vários deputados sociais-democratas.
Hugo Soares pediu então a palavra para dizer que o deputado visado tivera um “infortúnio” quando atropelou uma criança e que esse caso não resultou em qualquer processo judicial.
“Mas este parlamento sabe que se há alguém que sabe de processos judiciais e que foi condenado é o deputado André Ventura. Enquanto houver instituições, enquanto houver Estado de Direito e enquanto houver democracia, o PSD não permitirá que seja um qualquer deputado André Ventura que ofenda a sua honra”, completou o líder parlamentar social-democrata.
O presidente da Assembleia da República procurou encerrar a discussão com um aviso: “Temos um Código de Conduta e temos o dever de intervir nos trabalhos parlamentares com urbanidade, lealdade institucional. A obrigação é de nos abstermos de comportamentos que não prestigiem a instituição parlamentar”, acrescentou.
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