O diagnóstico da esclerose múltipla, doença degenerativa que afeta o sistema nervoso central, demora em média três anos em Portugal e, até ao início do tratamento farmacológico, a média chega quase aos dois anos, segundo um estudo hoje divulgado.
Apesar dos valores médios, o estudo realizado em 22 países europeus refere que um em cada 10 inquiridos admitiu ter esperado mais de seis anos para iniciar o tratamento com Terapias Modificadoras da Doença (TMD). Entre os que não chegaram a iniciar medicação, mais de metade (52%) diz que nunca recebeu prescrição médica.
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O estudo “Impacto dos Sintomas da Esclerose Múltipla”, promovido pela Plataforma Europeia de Esclerose Múltipla (EMSP), indica ainda que, em Portugal, dos que ainda não tinham iniciado o tratamento, 22% manifestaram receios quanto à administração das TMD, 6% disseram que o tipo de TDM prescrita não estava disponível e outros 6% que não tinham condições financeiras para suportar os custos.
Os dados serão hoje apresentados pela Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM), uma doença crónica, autoimune, inflamatória e degenerativa que afeta o sistema nervoso central. Atinge sobretudo os jovens – surge frequentemente entre os 20 e os 40 anos -, em particular as mulheres.
Em Portugal, estima-se que existam mais de 8.000 pessoas com esclerose múltipla, um número que para muitos especialistas está subestimado, tanto pelo número de pessoas sem diagnóstico quanto pelas que estão sem tratamento confirmado.
Os sintomas podem ser diversos, afetando sobretudo as capacidades físicas e cognitivas, e os especialistas alertam que o tempo que medeia entre o aparecimento dos primeiros sintomas e a confirmação do diagnóstico pode comprometer as possibilidades de “intervenção precoce e eficaz”.
Magda Fonseca, investigadora na área da Saúde Pública da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e responsável pela implementação do estudo em Portugal alerta: “A demora no diagnóstico e no acesso a tratamentos específicos pode comprometer a gestão de todos os sintomas que afetam a vida diária. Estas barreiras colocam em causa a eficácia das intervenções clínicas e aumentarão o impacto negativo da doença na qualidade de vida das pessoas afetadas, quer doentes, quer os seus cuidadores”.
A fadiga, os problemas sensoriais, as dores, os distúrbios do sono e o défice cognitivo são os sintomas mais comuns entre os doentes portugueses. O estudo indica que a média é de 13 sintomas relatados por pessoa e os mais debilitantes são a fadiga, as alterações motoras e os problemas no equilíbrio.
Um em cada cinco participantes no estudo disse não estar a trabalhar por causa da doença.
Além disso, 7% dos inquiridos desconhecem que tipo de esclerose múltipla têm, “o que levanta questões sobre a literacia em saúde, a comunicação médica e o estigma associado à doença”.
O presidente da SPEM, Alexandre Guedes da Silva, considera que este desconhecimento “é alarmante” e diz ser “essencial promover campanhas de esclarecimento, reforçar a formação dos profissionais de saúde e garantir que as pessoas com esclerose múltipla compreendem o seu diagnóstico e as opções de tratamento disponíveis”.
Segundo o estudo, a prestação de cuidados de saúde precisa de ser melhorada – apenas 70% diz que recebe cuidados satisfatórios – e há lacunas no apoio social: 12% das pessoas que precisam de cuidadores não têm qualquer assistência e apenas 9% contam com apoio regular, maioritariamente de familiares ou amigos.
Quase um em cada cinco (19%) doentes não recebem qualquer tratamento ou cuidado de saúde. As principais razões são “a percecionada falta dessa necessidade, a incapacidade financeira para a sua aquisição e a ausência de prescrição médica”.
Como prioridades o estudo aponta o reforço da aposta no diagnóstico atempado, capacitando profissionais de saúde e desmistificando a doença, a garantia de um acesso mais célere e equitativo aos medicamentos, com apoio de mais ensaios clínicos, uma maior comparticipação do Serviço Nacional de Saúde e a eliminação de barreiras administrativas, assim como um investimento na literacia em saúde e na qualidade da comunicação entre médicos e doentes.
Sugere ainda um maior apoio a cuidadores formais e informais – “com medidas eficazes e sustentáveis” – e a promoção de um sistema de cuidados “mais integrado, humano e centrado nas reais necessidades das pessoas com esclerose múltipla”.
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