Arrastar um sofá escada acima, manter uma prancha até os braços falharem ou resistir aos últimos segundos de um exercício exigente são situações em que muitas pessoas recorrem instintivamente a um palavrão. Longe de ser apenas um desabafo, essa reação pode ter um efeito real no corpo e na mente.
Um novo estudo conduzido por psicólogos sugere que dizer palavrões pode melhorar o desempenho físico, ajudando as pessoas a ultrapassar limites que normalmente mantêm em reserva. A investigação indica que o uso de linguagem tabu coloca o cérebro num estado de menor inibição e maior foco, permitindo usar mais força durante o esforço.
“Em muitas situações, as pessoas reprimem-se — consciente ou inconscientemente — e acabam por não usar toda a sua força”, explica Richard Stephens, psicólogo da Universidade de Keele. “Xingar é uma forma simples de se sentir mais concentrado, confiante e menos distraído, permitindo arriscar um pouco mais.”
Richard Stephens estuda os efeitos fisiológicos dos palavrões há mais de 15 anos. Um dos seus primeiros estudos, amplamente divulgado, mostrou que pessoas que proferiam palavrões conseguiam manter as mãos em água gelada durante mais tempo do que aquelas que diziam palavras neutras. A investigação valeu-lhe um Prémio Ig Nobel, mas também deu origem a um programa científico sólido.
O estudo mais recente incluiu dois experimentos pré-registados, envolvendo um total de 192 participantes, cujos dados foram depois combinados com resultados anteriores, elevando a amostra para cerca de 300 pessoas.
A tarefa era simples, mas fisicamente exigente: sentados numa cadeira, os participantes levantavam o corpo apoiando-se nos braços e mantinham a posição pelo maior tempo possível. A cada dois segundos, repetiam um palavrão à escolha ou uma palavra neutra, como “mesa”.
Os resultados foram consistentes: quem dizia palavrões manteve a posição entre 10% e 11% mais tempo do que quando utilizava palavras neutras.
Após o exercício, os participantes responderam a questionários sobre o que sentiram durante a tarefa. A análise revelou que o uso de palavrões aumentava três estados psicológicos-chave: estado de fluxo, autoconfiança e redução da distração causada pela insegurança.
O chamado estado de fluxo descreve a sensação de estar totalmente absorvido numa atividade, comum em atletas e artistas no seu melhor desempenho. Xingar parece ajudar a reduzir o excesso de autocontrolo e o medo do fracasso, libertando energia mental para a tarefa em si.
“Ao proferir palavrões, libertamo-nos temporariamente das restrições sociais e permitimo-nos ir mais longe”, afirma Stephens. Segundo o investigador, a natureza tabu dos palavrões é essencial: palavras inventadas ou suavizadas não produzem o mesmo efeito.
Os investigadores enquadram o fenómeno num contexto mais amplo de inibição humana. O medo do julgamento, por exemplo, pode limitar o desempenho em situações como falar em público, negociar salários ou regressar ao desporto após uma lesão. Embora os mecanismos de autocontrolo sejam essenciais para a convivência social, em momentos de esforço máximo podem tornar-se um obstáculo.
Neste sentido, os palavrões funcionam como uma forma rudimentar, mas eficaz, de ultrapassar esses travões internos. Vocalizações intensas já são comuns no desporto — gritos, grunhidos ou exclamações — mas os palavrões distinguem-se pelo seu forte conteúdo emocional.
“Xingar é uma ferramenta sem custos, sem drogas e imediatamente disponível para melhorar o desempenho”, resume Stephens. Ainda assim, os investigadores alertam que os palavrões não transformam ninguém num atleta de elite e podem ter consequências sociais.
O estudo, publicado na revista American Psychologist, abre caminho para futuras investigações sobre se o uso controlado de palavrões pode ajudar noutras situações exigentes, como apresentações públicas ou interações sociais onde a hesitação costuma limitar o desempenho.
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