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“Dana” entrou literalmente no dicionário dos espanhóis (pelos piores motivos)

Notícias de Coimbra com Lusa | 2 horas atrás em 27-10-2025

Imagem: X

As inundações que mataram mais de 230 pessoas no leste de Espanha em outubro de 2024 são hoje conhecidas no país como “a dana”, palavra que entrou no dicionário da Real Academia Espanhola após a tragédia.

Dana é o acrónimo da designação em espanhol de “depressão isolada [‘aislada’] em níveis altos”, mas até 10 de dezembro de 2024 era uma sigla (DANA).

Foi nesse dia, menos de dois meses após as inundações de Valência, que a sigla DANA passou a ser a palavra dana, ao ser integrada no dicionário da Real Academia Espanhola (RAE).

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Uma dana, segundo a RAE, é uma “depressão em níveis altos da atmosfera, que, isolada da circulação geral atmosférica, se move de forma independente e pode produzir grandes perturbações com precipitações muito intensas”.

“Parece-nos bem que dana tenha entrado na RAE, já que a sua utilização é cada vez mais habitual”, disse na altura o porta-voz da Agência Estatal de Meteorologia de Espanha (Aemet), Rubén del Campo.

Ainda assim, a Aemet fez uma precisão em relação à definição que está no dicionário de referência do castelhano, numa publicação nas redes sociais em 10 de dezembro do ano passado: “Tal como indica a definição, [uma dana] pode provocar chuvas intensas. Mas nem sempre que se aproxima uma dana ocorrem. São fundamentais outros fatores, como a chegada de ventos muito húmidos ou a orografia”.

Num artigo publicado em dezembro do ano passado, o jornal El País contou que o termo dana, hoje parte das conversas quotidianas em Espanha, tem menos de 40 anos e surgiu nos finais da década de 1980 no seio do Instituo Nacional de Meteorologia (INM), hoje Aemet.

O meteorólogo agora reformado Ángel Rivera é considerado o pai do termo dana e o próprio explicou ao El Pais que o INM procurava então um termo para substituir a designação “gota fria”, uma tradução do alemão “kaltlufttropfen” popularizada nas décadas anteriores por causa da televisão e que estava a ser usada de forma desvirtuada, para designar qualquer chuva torrencial ou inundação.

A opção acabou por ser dana, com base no termo em inglês (‘cutt-off low’ – depressão cortada ou separada), a que se acrescentou a designação “em níveis altos da atmosfera”.

DANA coincidia ainda com o apelido de Francisco García Dana, responsável pelo Centro de Análise e Previsão do INM, que tinha morrido recentemente e que assim os colegas quiseram homenagear, segundo Ángel Rivera.

Como escreveu o El País em 10 de dezembro do ano passado, a palavra dana é hoje omnipresente em Espanha e já era um termo do quotidiano antes das inundações de Valência, que acabaram porém por ser conhecidas como simplesmente “a dana”, associando o termo à tragédia.

As gotas frias ou danas “são fenómenos habituais na Península Ibérica” mas no outono reúnem-se “todos os ingredientes mais favoráveis” para que provoquem chuvas mais intensas, sobretudo, na zona do Mediterrâneo, “um mar muito cálido e cada vez mais nos últimos anos”, a que se associam “ventos húmidos de leste” e a orografia de algumas regiões, explicou à Lusa o geógrafo Samuel Biener, especialista em climatologia da plataforma Meteored.

“Aquilo que estamos a ver nos últimos anos é que temos um aumento de energia por causa do aquecimento do Mediterrâneo, que nos últimos anos alcançou temperaturas de 30 graus, similares às das Caraíbas. Esse ‘plus’ de energia favorece chuvas mais extremas na zona do Mediterrâneo. As gotas frias e as danas sempre existiram, mas nos últimos anos estão a tornar-se mais extremas precisamente por este problema e energia”, acrescentou.

Este especialista realçou que uma dana ou gota fria é “basicamente uma tempestade em níveis altos que ficou isolada da circulação atmosférica e que, por isso, pode seguir em qualquer direção, o que a torna imprevisível”, sendo que “muitas dessas gotas frias não causam chuvas torrenciais” e “não se deve associar desastre a gota fria ou dana”.

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