Coimbra

Crise Académica: “O país, o povo português, pedia a palavra. E não parou de a pedir até que lha deram”

Notícias de Coimbra | 5 anos atrás em 17-04-2019
 

Cinquenta anos depois do famoso “peço a palavra” do então presidente da direção-geral (DG) da Associação Académica de Coimbra (AAC), Alberto Martins, a mesma sala do Departamento de Matemática da Universidade de Coimbra (UC) abriu as portas, esta manhã, para acolher a cerimónia evocativa dos 50 anos da Crise Académica. 

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O atual presidente da DG/AAC, Daniel Azenha, o presidente da Câmara Municipal (CM) de Coimbra, Manuel Machado, o reitor da UC, Amílcar Falcão, e Alberto Martins recordaram esse momento histórico da luta estudantil contra a ditadura e celebraram, com o público presente, os valores da liberdade, da solidariedade e da democracia. 

Coube ao atual presidente da DG/AAC, Daniel Azenha, dar hoje a palavra, que não foi dada em 1969, a Alberto Martins.

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E Daniel Azenha não escondeu o que sentiu: “Arrepia pensar no momento que aconteceu nesta sala”. E foi com a sala de pé, a aplaudir, que Alberto Martins se deslocou para a tribuna.

A história foi contada, em primeira mão, pelo protagonista e houve um recuo de 50 anos no tempo. Alberto Martins lembrou o país em 1969, “pobre e analfabeto”, a ditadura e a guerra colonial, a luta estudantil, a inauguração do Departamento de Matemática da UC e o “peço a palavra”, a noite de 17 de abril, a carga policial, a perseguição aos estudantes, a Assembleia Magna, a greve às aulas e aos exames e a final da Taça de Portugal de futebol entre a Académica e o Benfica. “Nós tivemos que dar a volta ao destino e demos. Demos a volta ao destino com emoção, com racionalidade, com criatividade e sentido de responsabilidade”, afirmou, emocionado.

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Entre referências aos seus “velhos e queridos amigos de 1969”, os “verdadeiros obreiros da resistência dos estudantes à ditadura”, como ele disse, e pormenores sobre a crise académica que conduziu ao 25 de Abril de 1974, Alberto Martins falou também da importância de não esquecermos o passado e do que ainda falta fazer no futuro. “Só a compreensão do passado nos dá a capacidade de sonhar e construir o futuro. Há um célebre filósofo que diz «o passado está cheio de futuros que não se chegaram a cumprir». O passado de 1969 tem um conjunto de futuros que se cumpriram, a liberdade, a democracia, o fim da guerra, mas há também uma dimensão de sonho, de melhoria, de solidariedade, de humanidade, de combate às desigualdades que é um património de 1969 e que todos temos que ajudar a cumprir”, concluiu assim o seu discurso, sob os olhares emocionados da plateia, que se voltou a levantar para uma ovação ao presidente da DG/AAC em 1969. 

O presidente da CM Coimbra falou de seguida e salientou a “ousadia” de todos os intervenientes nesta luta estudantil. “Na Crise Académica de 1969, que contestou uma ditadura, então com mais de quatro décadas, o que emergiu foi a ousadia. A ousadia dos gestos, a ousadia das palavras, a audácia de tentar falar, de fazer ouvir a voz da necessidade de mudança”, defendeu Manuel Machado, que considerou o discurso de Alberto Martins “um dos mais curtos e mais eficazes discursos políticos da história”.

“Sobressaiu a audácia, a coragem, o desapego ao conforto quotidiano, o dever ético de lutar por uma sociedade melhor, o amor pela liberdade”, acrescentou o autarca, argumentando que aquele “peço a palavra” continha tudo. “A partir dali, o essencial do processo que levou ao 25 de Abril estava em marcha. O país, o povo português, pedia a palavra. E não parou de a pedir até que lha deram”, concluiu Manuel Machado.

E foi quando o reitor da UC era chamado para encerrar os discursos, que se pediu a palavra. Décio de Sousa, presidente da Assembleia Magna da AAC em 1969, pediu a palavra para recordar o que foi essa mesma assembleia, “uma verdadeira lição de civismo e de espírito democrático” e para fazer um Éferreá, executado a preceito por todos os que se encontravam na sala.

As intervenções terminaram, então, com o discurso do reitor da UC, Amílcar Falcão, que agradeceu a “todos os estudantes que, na voz de Alberto Martins, pediram a palavra em 1969” e defendeu que esse exemplo “deve ser recordado para sempre, para que ninguém se esqueça da ditadura e da capacidade de intervenção dos estudantes”.

A cerimónia evocativa dos 50 anos da Crise Académica contou com a sala cheia e a presença das mais diversas personalidades académicas, políticas, civis e militares. 

A seguir à cerimónia distribuiram-se flores, numa alusão à operação flor, foi apresentado o conjunto escultórico “Peço a Palavra”, da autoria de Carlos Ramos, que se encontra junto à Escadas Monumentais, e de seguida foi descerrada a placa evocativa dos 50 anos da Crise Académica, no edifício da AAC.

O programa de comemorações dos 50 anos da Crise Académica, que tem a organização da AAC, contando ainda com a CM Coimbra e a UC, e a parceria da Fundação Inatel e da Turismo do Centro, pode ser consultado aqui.

Veja o vídeo do Direto NDC:

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