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Conheça o homem que enfrentou ciclones e agora domina o mar… em madeira

Notícias de Coimbra | 59 minutos atrás em 12-09-2025

O Largo da Barrinha, na Praia de Mira, recebe até domingo, 14 de setembro, a 26.ª edição da Mostra Gastronómica da Região da Gândara. Durante quatro dias, a gastronomia, o artesanato e a música atraem milhares de visitantes à beira-mar.

Entre os expositores de artesanato, o NDC encontrou João de Deus, mais conhecido como João do Arco-Íris, artesão mirense que transformou as suas memórias do mar em peças únicas de madeira.

João dedica-se a recriar, em miniatura, barcos tradicionais, palheiros e símbolos religiosos da sua terra natal.

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A paixão pela construção de barcos nasceu ainda em criança. “Comecei com barquinhos de barro, pequenininhos, quando andava na escola”, recorda.

Mas cedo trocou a brincadeira pela vida dura do mar. Aos 16 anos foi para a pesca da sardinha e, pouco depois, para a pesca do bacalhau.

“Houve uma viagem em que apanhámos um ciclone a 300 milhas dos Açores. O barco ficou partido, sem ponte de comando, torcido pelas vagas. Foram dias de medo. Só conseguimos entrar no Porto, no dia 23 de dezembro de 1973, já sem mantimentos e quase sem gasóleo”, conta, com a serenidade de quem conhece bem os perigos do oceano.

Mais tarde, integrou a Marinha Mercante Holandesa, experiência que classifica como “um dos melhores anos da minha vida”, tendo corrido mundo antes de regressar definitivamente a Mira, em 1980.

De volta à terra natal, João abriu restaurantes, entre eles o conhecido Arco-Íris, que lhe valeu a alcunha pela qual ainda hoje é tratado. Mas foi no artesanato que encontrou a forma mais duradoura de homenagear a sua ligação ao mar.

Na mostra, apresenta réplicas de embarcações tradicionais: desde os moliceiros da ria de Aveiro até ao navio bacalhoeiro Santa Maria Manuela. Há também reproduções de palheiros típicos da Praia de Mira e até de barcos que guardam histórias peculiares, como o Zé Magro. “Era tão pobrezinho que nunca pescava nada. Então os colegas diziam: ‘Epá, bota-lhe o Zé Magro’, e ficou o nome”, recorda entre risos.

Nas suas peças não falta a devoção religiosa que sempre acompanhou os pescadores. “Quando o mar ficava bravo, recorriam todos à capelinha para rezar. Crescemos com uma adoração à Nossa Senhora da Conceição incrível”, explica. A padroeira da Praia de Mira e de Portugal surge esculpida em destaque nas suas criações, lado a lado com a representação da Nossa Senhora de Fátima.

Hoje, João partilha a paixão com os netos, na esperança de manter viva a tradição. “O mais velho tem tendência para isto, embora não queira admitir. O mais novo é mais para a farra”, diz entre sorrisos.

Na Mostra Gastronómica da Região da Gândara, João não mostra apenas barcos em miniatura. Mostra pedaços de uma vida inteira dedicada ao mar — dura, mas sempre marcada pela paixão e pela saudade.

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