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“Conde de Ferreira” não se (re)vê a “Adoçar a alma para o inferno III”

Notícias de Coimbra | 11 meses atrás em 01-06-2023

A Bienal de Fotografia do Porto classificou de censura a retirada da instalação “Adoçar a alma para o inferno III” por parte da administração do Centro Hospitalar Conde de Ferreira, que, por seu lado, alegou que contém “referências ofensivas”.

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Em comunicado, a organização da Bienal de Fotografia do Porto reiterou o apoio a Dori Nigro e Paulo Pinto, autores de “Adoçar a alma para o inferno III”, e salientou que a restante exposição, intitulada “Vento (A)Mar”, com curadoria de Georgia Quintas, vai permanecer no Panóptico do Centro Hospitalar Conde de Ferreira (CHCF), “onde o público continua a poder visitar nove das dez peças produzidas para esta mostra” até 01 de julho.

De acordo com a organização da bienal, numa notícia avançada pelo jornal Público, “Adoçar a alma para o inferno III” foi mandada encerrar no dia da inauguração – 16 de maio -, por um administrador do CHCF, unidade de saúde que pertence à Santa Casa da Misericórdia do Porto (SCMP).

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Segundo a bienal, no mesmo comunicado, as explicações que foram dadas pela direção do CHCF basearam-se no destaque dado ao “passado escravocrata do patrono do Hospital, Joaquim Ferreira dos Santos, 1.º Conde de Ferreira, comprovadamente um dos maiores traficantes de pessoas escravizadas do século XIX português”.

Por seu lado, num comunicado da mesa administrativa da SCMP, enviado hoje à agência Lusa, a instituição refere que “com efeito, a comunidade de saúde, doentes, trabalhadores e suas famílias sentem-se afetados pela expressão utilizada quando se referem a ‘quantas pessoas escravizadas valem um hospital psiquiátrico?’”.

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“A Santa Casa da Misericórdia do Porto lamenta não poder responder favoravelmente ao pedido da direção da Bienal de Fotografia do Porto 2023”, confirmou a SCMP.

“Em primeiro lugar, porque tal situação não estava prevista no protocolo acertado entre as partes, ao mesmo tempo, considerando não existirem condições psicológicas para a concretização do pedido”, lê-se no comunicado.

A SCMP considera que há “referências ofensivas à memória do Conde de Ferreira” e que estão “disponíveis para, imediatamente”, procederem à entrega dos objetos nas instalações da direção artística da bienal, “em momento a acordar”.

“Como instituição de espírito inovador e tolerante, a Santa Casa da Misericórdia do Porto manterá, sempre, as suas portas abertas e não terá dificuldade, na forma adequada, de discutir a sua história, os seus comportamentos, os seus benfeitores. Como diria Ortega y Gasset, somos nós e a nossa circunstância”, conclui o comunicado.

Por seu lado, a equipa da bienal “aplaudiu e acarinhou” a opção dos artistas e da curadora, que “souberam trazer estes assuntos” para a programação da Bienal de Fotografia do Porto.

Como explicou à Lusa o diretor da bienal, Virgílio Ferreira, o ato que feriu os “ideais de democraticidade” ocorreu durante a inauguração da exposição “Vento (A)mar”, composta por nove celas, quando o administrador do CHCF mandou encerrar a Cela 7, onde estava uma instalação que abordava a “história esclavagista do Conde de Ferreira e de onde veio o seu legado”.

A instalação composta por espelhos e um açucareiro fazia perguntas para serem lidas pelos visitantes sobre quantos escravos seriam necessários para construir um hospital ou para construir 120 escolas.

A Bienal de Fotografia do Porto afirmou ainda querer recusar o “imediatismo do escândalo e a superficialidade do espetáculo”, mas assegurou que não “foge ao debate”

“Os artistas Dori Nigro e Paulo Pinto foram acusados de invocar factos históricos que — para o mal e para o bem — nunca foram polémicos na sociedade portuguesa. Percebemos que por vezes seja doloroso recordar certas circunstâncias da nossa história partilhada, pedindo aos nossos concidadãos que recordem vítimas e dívidas ascendentes. Neste ponto a bienal quer reforçar o desgosto da nossa equipa com o sucedido, mas também a ideia de que o nosso programa deveria ser um aliado natural do projeto do CHCF. Também nós apontamos no sentido de uma terapêutica, uma prática e uma ética focada na mudança positiva e num trabalho colaborativo de construção de um mundo melhor”, acrescentou a organização.

As exposições da Bienal de Fotografia do Porto, que abriu no dia 18 de maio, estão espalhadas pela cidade em locais como o Centro Português de Fotografia, a Casa Comum da Reitoria da Universidade do Porto, a Fundação Marques da Silva, a Estação de Metro de São Bento, a Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, o Mira Fórum, entre outros.

O acesso às 123 atividades paralelas que vão decorrer pelo Porto é gratuito, mas vai estar sujeito à lotação dos espaços.

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