Problemas dentários têm afligido a humanidade há milénios. Apesar dos avanços significativos nos últimos cem anos, o tratamento das cáries continua, muitas vezes, a recorrer a soluções simples: perfurar, preencher e “remendar” o dente. Mas e se não fosse necessário recorrer a brocas ou obturações sintéticas?
Um estudo inovador liderado por investigadores do King’s College London demonstra que um novo tipo de pasta de dentes pode ajudar os dentes a regenerarem o esmalte naturalmente, utilizando queratina — a proteína fibrosa presente no cabelo e na lã.
O esmalte dentário é a substância mais dura do corpo humano, protegendo os dentes de mastigação, trituração e ataques ácidos ao longo de décadas. No entanto, quando se perde, não há regeneração natural: o esmalte não possui irrigação sanguínea nem capacidade de reconstrução. Esta erosão precoce leva frequentemente a cáries, restaurações e eventual perda dentária.
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“Ao contrário dos ossos e do cabelo, o esmalte não se regenera; uma vez perdido, está perdido para sempre”, explica Sherif Elsharkawy, autor principal do estudo e consultor em prótese dentária.
A equipa do King’s College adotou uma abordagem completamente nova: em vez de reparar o esmalte, decidiram regenerá-lo. Criaram um filme à base de água, feito de queratina extraída da lã de ovelha, que imita a estrutura do esmalte natural durante o desenvolvimento do dente. Este filme, quando mergulhado numa solução rica em minerais, serve de suporte para a formação de novos cristais de esmalte.
Os testes laboratoriais demonstraram resultados promissores. O filme de queratina auto-organiza-se em estruturas cristalinas semelhantes às do esmalte inicial. Quando aplicado sobre lesões do esmalte, promoveu o crescimento de uma camada protetora, atraindo íons de cálcio e fosfato para regenerar a superfície dentária. Após 30 dias, as amostras apresentavam camadas densas e organizadas, com propriedades muito semelhantes ao esmalte natural.
Segundo Sara Gamea, investigadora de doutoramento e primeira autora do estudo, a queratina apresenta vantagens significativas: é sustentável, biocompatível e oferece uma aparência mais natural do que as resinas plásticas usadas atualmente na odontologia restauradora.
Os próximos passos incluem testes em humanos para validar a segurança e eficácia do método em situações reais. Os investigadores esperam que este desenvolvimento possa abrir caminho para uma nova era na odontologia, baseada na biorregeneração em vez do simples reparo mecânico.
“Estamos a entrar numa era empolgante, na qual a biotecnologia nos permite restaurar a função biológica usando os próprios materiais do corpo. Com mais desenvolvimento e parcerias com a indústria, poderemos ter sorrisos mais fortes e saudáveis a partir de algo tão simples quanto um corte de cabelo”, conclui Sherif Elsharkawy.
O estudo foi publicado na revista Advanced Healthcare Materials e poderá marcar o início de um novo paradigma no cuidado dentário, focado em regeneração em vez de intervenção invasiva.
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