Coimbra

“Choradinho” de arguida não comove o Ministério Público

Rui Avelar | 4 anos atrás em 09-06-2020

O Ministério Público preconizou, hoje, no Tribunal de Coimbra, pena de prisão efectiva (mais de cinco anos de cadeia) para uma ex-funcionária da Segurança Social acusada por um desfalque de 630 000 euros.

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Na fase de alegações da audiência de julgamento de P. Bogalho, 50 anos de idade, a procuradora Sandra Alcaide considerou destituída de credibilidade a “postura de arrependimento” da ex-funcionária.

“O que fez com o dinheiro não corresponde” ao teor da confissão livre e espontânea de P. Bogalho, alegou a magistrada do MP, em cujo ponto de vista o desfalque ocorreu para a arguida “viver como bem lhe apeteceu”.

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A antiga funcionária, que invocou desespero, com o marido emigrado e dois filhos a cargo, chorou ao confessar a autoria de um crime de peculato.

Pratica peculato o funcionário que, ilegitimamente, se apropriar, em proveito próprio ou de outra pessoa, de dinheiro ou de qualquer coisa móvel (…), que lhe tenha sido entregue, esteja na sua posse ou lhe seja acessível em razão das suas funções.

“Não sei o que me passou pela cabeça…”, contou P. Bogalho, que afirmou ter dito aos filhos haver obtido um empréstimo.

Foi “um alívio” ser descoberta, na medida em que se sentia “incapaz de parar”, acrescentou a ex-funcionária da Segurança Social.

Houve “muito tempo para se arrepender”, fez notar o presidente de um colectivo de juízes, Rui Pacheco.

“Não é para isto que o dinheiro público serve e não é uma conduta destas que se espera de um(a) funcionário(a) do Estado”, advertiu a magistrada Sandra Alcaide.

Em resposta a uma pergunta de outro juiz, João António Ferreira, P. Bogalho reconheceu bastarem 20 000 euros para resolver os problemas invocados para enveredar pela prática da falcatrua.

“Tudo o que extravasa 20 000 euros” – e é mais de meio milhão – tem a ver com “um estilo de vida”, assinalou o magistrado judicial.

A arguida, que acenou com dívidas à Autoridade Tributária, comprou um carro (em segunda mão), mediante dinheiro vivo (4 000 euros), fez obras em casa, gozou férias e adquiriu roupa.

“Nem me apercebi [do volume] do dinheiro gasto”, desabafou P. Bogalho.

Neste contexto, admitiu ter alimentado a ociosidade de um filho e indicou que pagou dívidas de jogo por ele contraídas. “Vi-o quase de rastos (…); queria que ele fosse um homem”, declarou.

P. Bogalho, que voltou a trabalhar, na sequência de despedimento ao abrigo de processo disciplinar, espera conseguir esquecer aquilo que se passou e “andar com a vida para a frente”.

A falcatrua está relacionada com processamento fraudulento de pagamento de uma prestação social denominada abono de família pré-natal.

A arguida – que já terá estado implicada em manipulação de dados para concessão de pensões por invalidez, havendo sido punida, então, com 90 dias de suspensão – encontra-se, agora, sob suspeita de criar perto de uma centena de falsos perfis de grávidas sem olhar a locais de residência para situar as supostas beneficiárias.

Em quatro contas bancárias esmiuçadas pela Polícia Judiciária não foi possível apreender mais de 4,21 euros, mas P. Bogalho, em operações através do Multibanco, durante mais de 50 meses, efectuou levantamentos no montante de 233 770 euros.

A entidade titular da acção penal imputa à arguida o cometimento de peculato, branqueamento de capitais, burla informática, falsidade e acesso ilegítimo.

Descrita como introvertida, por uma directora de núcleo, P. Bogalho pautou-se pela discrição até que o exercício de invenção de supostas beneficiárias grávidas levou uma mulher a surpreender o Instituto da Segurança Social com a indicação de que nada recebera apesar de constar o contrário.

Ana Paula Valentim, defensora da arguida, considerou que ela “merece uma oportunidade”, tendo invocado como atenuantes “a nova fase de vida”, a confissão e “a facilidade” com que pôde agir a outrora funcionária.

Neste contexto, a advogada preconizou condenação até cinco anos de cadeia para a arguida poder usufruir de suspensão da execução da pena mediante condições.

Face às notícias, divulgadas há 15 meses, acerca da constituição de P. Bogalho como arguida, uma idosa queixou-se de ter sido por ela ludibriada no pagamento de contribuições pelo regime de serviço doméstico, apurou NOTÍCIAS de COIMBRA.

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