Cerca de 40% das Unidades de Saúde Familiar (USF) dizem ter falta de profissionais na equipa e mais de 80% registaram ausências prolongadas, que tiveram de ser colmatadas maioritariamente com profissionais da mesma equipa.
O estudo “O Momento Atual da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários em Portugal 2024/2025”, desenvolvido pela Associação Nacional das Unidades de Saúde Familiar (USF-AN) e hoje divulgado, mostra que cerca de 60% dos coordenadores dos centros de saúde considera ter equipa (enfermeiros, secretários clínicos e médicos) completa, sendo as carências mais evidentes em zonas de menor densidade populacional.
O documento refere que 81% das USF registaram ausências prolongadas e, na maioria dos casos (58,2%), a substituição foi assegurada unicamente pelos profissionais da equipa.
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Em 9,2%, a substituição foi conseguida com profissionais de fora da equipa, sendo que num terço das unidades (32,6%) foi necessário misturar os dois recursos.
Na maioria dos casos, foi preciso substituir médicos, sendo praticamente nulos os casos de substituição de outros profissionais.
Os dados mostram que a situação tem vindo a “melhorar ligeiramente” desde 2020/21, mas, em média, continua a faltar um profissional de cada grupo profissional nas USF, em relação ao que estava acordado.
Esta carência assume uma maior expressão nos médicos, seguido dos enfermeiros e, depois, dos secretários clínicos.
“Neste momento, temos listas [de utentes] muito grandes e listas de utilizadores, ou seja, são pessoas que utilizam muito o serviço”, disse André Biscaia.
Além das consultas, os profissionais têm muita atividade não presencial, como responder a ‘emails’, atender telefonemas, fazer relatórios e passar receituário crónico, insistindo: “A atividade não presencial, às vezes, é o dobro da presencial”.
A dimensão da lista de utentes é outra das prioridades apontada no estudo, que refere que a elevada carga de utentes por médico “é um dos maiores entraves” à prestação de cuidados de qualidade, contribuindo para o ‘burnout’ dos profissionais.
Muitas unidades consideram que a dimensão atual das listas de utentes – resultante da lei que enquadra as USF – e “a pressão constante da tutela e das Unidades Locais de Saúde” para aumento das listas contribuem para a exaustão e perda da qualidade dos cuidados prestados, reduzindo a motivação e o numero de profissionais que querem trabalhar no Serviço Nacional de Saúde.
Quanto às carreiras, mais de 90% das USF concordam com a criação da carreira de técnico superior de secretariado clínico e o estudo evidencia dificuldades na abertura de concursos para recrutamento de enfermeiros especialistas e na certificação de competências no âmbito da enfermagem de saúde familiar.
Face ao diagnóstico, os autores sugerem mecanismos de compensação formal para ausências prolongadas e trabalho suplementar (em 55,7% das USF o trabalho realizado para além do horário oficial não é considerado para compensação futura).
No mapa de melhorias elaborado neste estudo, a USF-AN propõe também a criação de uma bolsa de prestadores da ULS (que integra hospitais e centros de saúde).
Como exemplo, lembra que de algumas ULS (sobretudo no Norte e Centro) já abriram concursos para preencher uma bolsa de médicos de família para suprir estas ausências prolongadas e diz que se deve fazer o mesmo para outras profissões da saúde.
O estudo baseia-se nas respostas de coordenadores de 538 Unidades de Saúde Familiar (USF), correspondentes a 77,6% das USF existentes no início do estudo. Os dados foram recolhidos entre julho e setembro de 2025.
No topo das prioridades identificadas pelos coordenadores estão a necessidade de conciliar as atividades na USF e a vida pessoal/familiar e de políticas que deem prioridade aos cuidados de saúde primários, assim como interoperabilidade entre programas informáticos nas USF.
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