Os militantes do Bloco de Esquerda vão eleger este fim de semana, na 14.ª Convenção Nacional, uma nova direção que deverá ser coordenada por José Manuel Pureza, num dos momentos mais críticos da história do partido.
Há cerca de dois anos, quando Mariana Mortágua foi eleita coordenadora nacional do BE e prometia “uma vida boa”, o seu alvo principal era “o pântano” da maioria absoluta do PS.
Mortágua, na altura com 36 anos, conhecida pela sua assertividade nas comissões de inquérito ao BES, surgia como uma figura de continuidade mas também de início de um novo ciclo, após a longa coordenação de mais de uma década de Catarina Martins (assumida em parte com João Semedo).
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Este fim de semana, os bloquistas regressam ao Pavilhão do Casal Vistoso, em Lisboa, num contexto radicalmente diferente: o país é governado por PSD/CDS-PP, o Chega é o maior partido da oposição, e o BE viu a sua representação diminuir substancialmente, com apenas uma deputada no parlamento.
Em apenas dois anos de mandato, Mariana Mortágua – que está de saída – enfrentou oito eleições: duas legislativas, umas europeias, três eleições na Madeira, uma nos Açores e, mais recentemente, as autárquicas.
O cenário tem sido de declínio eleitoral: após um regresso ao parlamento regional da Madeira, em 2023, o BE perdeu a sua representação; nos Açores, passou de dois mandatos para um; nas europeias, conseguiu eleger a antiga coordenadora Catarina Martins, mas perdeu um dos lugares.
Nas legislativas deste ano o BE apostou no regresso dos seus fundadores às listas, com Francisco Louçã, Fernando Rosas e Luís Fazenda a responder à chamada.
Contudo, a estratégia revelou-se insuficiente para inverter a queda, com o BE a ter o seu pior resultado de sempre e a passar para a representação única na Assembleia da República pela primeira vez na sua história.
Nas autárquicas de outubro, a representação local, já residual, também diminuiu, passando para uma vereadora (em Lisboa) e 17 deputados em câmaras e freguesias.
Além das quedas eleitorais, um dos momentos mais conturbados do mandato de Mortágua foi a forte polémica relativa a despedimentos no partido, em 2022 (quando Catarina Martins era coordenadora), que incluíram duas mulheres que tinham sido mães há pouco tempo.
Mais recentemente, a bloquista foi fortemente criticada por alguns partidos e setores da sociedade pela sua participação numa flotilha internacional que pretendia levar ajuda humanitária até Gaza, ato que a levou a ser detida pelas autoridades israelitas.
No mês passado, Mortágua anunciou que não estava disponível para se recandidatar ao cargo e José Manuel Pureza foi o nome escolhido pelos bloquistas da moção ‘A’ para encabeçar as listas à Mesa Nacional e à Comissão Política.
Com 80% dos delegados, Pureza, natural de Coimbra, antigo vice-presidente da Assembleia da República e ex-líder parlamentar bloquista, deverá ser eleito, numa liderança protagonizada por um católico progressista.
À reunião magna deste fim de semana candidatam-se mais quatro moções opositoras (S, H, C e B), todas com críticas à estratégia política da atual direção e queixas de falta de democracia interna.
Além de elegerem os órgãos nacionais (Mesa Nacional, Comissão Política e Comissão de Direitos), os bloquistas vão também aprovar alterações aos estatutos, depois de alguns reparos do Tribunal Constitucional, que pediu uma maior densificação do catálogo de deveres.
São ainda estabelecidos prazos concretos para decisões relativas a inquéritos internos, outro dos alertas deixados pelos juízes do Palácio Ratton.
De fora fica a polémica “lei da rolha”, muito contestada pela oposição e, entretanto, retirada, na qual a direção propunha que os bloquistas deveriam proteger o “bom nome” do partido.
Um quarto de século após a sua fundação, o BE tem como principal desafio voltar a recuperar o espaço político que parece ter perdido para partidos como o Livre ou aumentar a sua implantação local, à semelhança de forças como o PCP.
Tal tarefa não se avizinha fácil numa fase em que os eleitores portugueses se inclinam para o campo político da direita e a esquerda se encontra enfraquecida, dez anos depois do primeiro governo suportado pela ‘geringonça’.
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