O fotógrafo, Arlindo de Almeida Santos, nascido na vila de Arrifana, lembra-se do cheiro do laboratório, de deslizar a película sobre a mesa e do clique da máquina a fixar o mundo à sua maneira, recebe o Notícias de Coimbra e conta como tudo começou.
Charles Bourée, autor de vários manuais e notas técnicas publicados em Paris, e o seu manual em português Fotografia Prática ao Alcance de Todos (tradução de S. de Almeida) mudaram para sempre o destino de Arlindo de Almeida Santos. Fotógrafo e educador do olhar na arte de capturar imagens e criar novas ferramentas para o fazer, Arlindo concluiu há cinco anos uma máquina fotográfica que chamou “do meu tamanho”, por ser literalmente da altura do seu inventor.
O percurso do senhor Arlindo como aprendiz curioso é marcado pela paixão e pelo entusiasmo da fotografia. Ao longo da vida, construiu treze máquinas fotográficas com a destreza de quem também sonhava ser engenheiro mecânico. A loja que mantém na Baixa de Coimbra, a Diorama, é um dos seus maiores tesouros, juntamente com a família, que sempre esteve ao seu lado. “A minha vida foi marcada por este ofício. A paixão pela fotografia deixou uma marca indelével e será sempre parte de mim. A minha família sempre me apoiou, especialmente a minha mulher, que conciliou o cuidado dos quatro filhos com a minha dedicação à arte.”
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Em outros tempos, num laboratório industrial de fotografia a cores, situado na Avenida Fernando Magalhães e em outros dois pontos da cidade, trabalhava com dez funcionários.
“Os estabelecimentos funcionavam em simultâneo, num período em que a fotografia era uma atividade próspera e valorizada como comércio.” Atualmente, segundo o senhor Arlindo, a fotografia impressa praticamente desapareceu com a massificação dos telemóveis; a maior parte das imagens é partilhada digitalmente, tornando a impressão fotográfica uma raridade.
Em 1952, com apenas oito anos, teve o primeiro contacto com a fotografia. Arlindo conta que na escola primária, um colega levou um negativo fotográfico, na altura feito numa chapinha de vidro. Curioso, quis descobrir como se reproduzia aquela imagem e, aos dez anos, encontrou numa livraria o manual de Fotografia de Charles Bourée, que mais tarde o ajudaria a alçar voos na arte de fotografar. Assim escreveu a sua história como fotógrafo. Ao todo, são 71 anos dedicados a este mundo misterioso e fascinante.
A fotografia, no início, era um mistério que gradualmente se transformou em realidade. Arlindo esteve também envolvido no associativismo entre fotógrafos em Portugal, tendo sido presidente do conselho fiscal da Associação Nacional dos Industriais de Fotografia. “Juntei amigos à minha volta e desenvolvemos diversas iniciativas em prol da fotografia no país.”
O seu primeiro equipamento foi uma máquina rudimentar conhecida como “caixote”, inventada por George Eastman, da Kodak. Esta caixa simples, munida de lente e obturador, permitia ao senhor Arlindo tirar as primeiras fotografias em rolos, posteriormente reveladas. Mais tarde, trabalhou com máquinas mais sofisticadas, incluindo a Reflex, fabricada na Alemanha, utilizada nos programas Apollo 11 da NASA para registar imagens na Lua.
Ao longo da carreira, experimentou dezenas de máquinas e técnicas: fotografia panorâmica, macrofotografia e fotografia de grande formato, como chapas de 30×40 cm, que produzem imagens de alta qualidade. Desenvolveu ainda acessórios específicos para realizar macrofotografias sem grandes gastos, adaptando peças antigas às novas exigências técnicas.
Quando questionado sobre quantas imagens já captou, responde: “Eu próprio já perdi a conta. Até já perdi algumas recentemente, porque as fotografias eram armazenadas nos computadores e, quando estes avariam, perde-se muito trabalho. Portanto, não posso precisar quantas imagens tenho — são muitos milhares, muitos milhares mesmo.”
A transição do preto e branco para a cor, e posteriormente do analógico para o digital, acompanhou de perto durante toda a carreira. Durante 26 anos, visitou bienalmente a Feira Mundial de Fotografia em Colónia, na Alemanha, sempre a aprender e a acompanhar as evoluções da área.
“Participei em concursos de arte fotográfica, tendo inclusive conquistado o primeiro prémio numa exposição, embora o prémio nunca tenha sido entregue devido à organização artesanal do evento. O retrato e a fotografia de pormenor sempre foram as minhas áreas preferidas.”
Entre os seus trabalhos destacam-se imagens panorâmicas de Coimbra, capturadas em 360°. Apesar da massificação do digital e da qualidade crescente dos telemóveis, Arlindo nunca utilizou estes dispositivos profissionalmente.
“Para mim, a essência da fotografia reside na emoção do revelado: a incerteza sobre o resultado final e a perceção da imagem depois de concluída. Fotografar exige sensibilidade, atenção ao enquadramento e à luz, que, como alguém disse um dia, é a forma de ‘escrever com luz’.”
Dos cinco netos, dois seguem ligados à imagem: um com licenciatura em multimídia e outro com mestrado em novas tecnologias da informação, demonstrando que a paixão pela fotografia e pelo cinema se mantém nas gerações futuras.
Em mais de sete décadas, Arlindo colecionou cerca de 350 a 400 máquinas fotográficas, algumas expostas no seu “MiniMuseu” no Diorama, para que as pessoas possam recordar a história e a evolução da fotografia. Cada máquina, cada técnica e cada imagem capturada refletem não apenas a evolução tecnológica, mas também a sua vida dedicada à arte de registar o mundo com luz.
Hoje, a olhar para trás e para o futuro, Arlindo de Almeida Santos, com 81 anos, sente o peso doce das memórias sobre os ombros. Cada imagem captada parece sussurrar histórias de rostos que desapareceram, ruas que mudaram e instantes que, por um segundo, ficaram imortalizados. Confessa que não sabe exatamente como a fotografia continuará a evoluir, mas há algo que o tempo não poderá apagar: a arte marcou-o de forma indelével.
Diorama – Estúdios e Laboratórios de Fotografia está localizado na Rua dos Esteireiros n.º.16, Coimbra. Contactos: 239 838 665 / 910 942 967 e dioramafoto@gmail.com
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