Arganil era um paraíso para estrangeiros que prometem ficar para a reconstrução

Na zona de Benfeita, em Arganil, há quase tantos estrangeiros como portugueses. As encostas da Serra do Açor e a Mata da Margaraça eram o seu paraíso. No meio das cinzas, prometem arregaçar as mangas e ajudar na reconstrução.
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Caroline Rodger viajou da Escócia para Portugal há cinco anos, trocando um trabalho “stressante” pela vida em comunidade no interior do país, tendo-se apaixonado pelas pessoas e pela natureza que a rodeava.
Como ela, muitos outros encontraram em Arganil e concelhos vizinhos um modo de vida alternativo, em comunhão com a natureza, que parece agora completamente destruído.
Caroline anda à beira da pequena e ziguezagueante estrada que percorre os montes em direção à Serra do Açor à procura dos seus dois gatos, Fubu e Cushy, que não sabe onde estão.
A sua casa e a sua carrinha arderam às portas da Aldeia de Xisto de Benfeita.
“Perdi tudo. Todas as minhas coisas foram com as chamas”, disse à agência Lusa Caroline, contando que como ela há mais estrangeiros que perderam as suas casas.
Quando as chamas estavam próximas, dirigiu-se para a aldeia e por lá ficou com outros estrangeiros que tinham procurado abrigo em Benfeita.
“Estamos traumatizados. Os fogos encurralaram-nos na aldeia. Todos pensámos que íamos morrer, com tudo a arder à nossa volta”, conta Alex Conlund, que viajou da Irlanda com o seu marido.
Escolheu viver em Pardieiros, em plena Serra do Açor, por amor “à floresta tradicional, com as suas grandes árvores e rios”.
Com o marido reformado, estavam há ano e meio a restaurar uma antiga quinta, que ficou “completamente queimada”.
“Era o projeto para o resto da nossa vida”, diz Alex, com um olhar e tom de voz que mantêm o desespero daquilo que sentiu no domingo.
Entre soluços e lágrimas, sublinha que na sua quinta apenas sobreviveram “os castanheiros e os carvalhos”.
“Os eucaliptos e os pinheiros estão a assassinar este país. Isto é homicídio”, frisou Alex, revoltada por ver a Mata da Margaraça, que tanto gostava, quase completamente destruída.
No entanto, quer ficar e lutar para ajudar na reconstrução.
Caroline é da mesma opinião.
“Vamos todos ficar. Ninguém vai embora. Vamos ajudar a replantar as árvores, mas de forma consciente e segura, para que não ajude a criar incêndios. Toda a gente que conheço ninguém diz que quer ir embora. Perdemos tudo, mas todos querem ficar. Vamos ser mais fortes”, sublinhou a escocesa.
Na aldeia de Benfeita, onde a proporção de estrangeiros e portugueses é quase 50-50, Adelino Simões ainda não conseguiu perder o hábito que ganhou nos últimos oito anos, mesmo que agora não valha a pena.
Todos os dias, acordava e, depois do café da manhã, ia para o cimo da aldeia tratar das suas cabras.
Perdeu os barracões que tinha de apoio à agricultura e salvou quatro cabras, que já vendeu por não ter pasto para as alimentar.
“Ardeu tudo o que tinha lá para cima [num monte próximo da aldeia]. Ainda hoje lá fui e fui fazer o quê? Perdi a rotina e perdi a cabeça também”, conta.
Agora, procura ajustar-se a uma nova rotina, sem as suas cabras e sem a agricultura, numa terra onde era o único com animais.
“Se for ao café, vê um português e de resto é uma dúzia de estrangeiros. Se isto está mau, seria muito pior se não houvesse estrangeiros”, nota.
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