Um estudo realizado pela Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Politécnico de Coimbra (ESTeSC-IPC) revelou que 29% das crianças apresentam problemas audiológicos à entrada para o 1º Ciclo do Ensino Básico. Os dados reforçam a importância da realização de rastreios em idade pré-escolar, uma vez que as dificuldades auditivas podem ter impacto significativo na aprendizagem da leitura e da escrita.
O estudo “Preschool Hearing Screening: Nineteen Years of the Coração Delta Project in Campo Maior, Portugal”, publicado na revista Audiology Research, analisa os resultados de dezanove anos de rastreios audiológicos realizados por docentes e estudantes da ESTeSC-IPC em Campo Maior, ao abrigo de um protocolo com a associação Coração Delta. Durante este período, foram realizados rastreios a 1068 crianças, com idades entre os cinco e os seis anos. Dessas, 310 (29 por cento) apresentaram algum tipo de problema audiológico. As ocorrências mais frequentemente registadas foram alterações no timpanograma, manifestadas unilateralmente em 104 crianças (9,7%) e bilateralmente em 81 crianças (7,6%).
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“Embora os rastreios auditivos neonatais estejam largamente implementados em Portugal, a prevalência de alterações auditivas quase duplica em idade pré-escolar”, explica Margarida Serrano, docente da ESTeSC-IPC e coordenadora do estudo (que conta também com a participação da docente da ESTeSC-IPC, Cláudia Reis, e dos estudantes de licenciatura em Audiologia, Joana Pereira, Joana Teixeira, João Mendes e Mariana Pereira). A investigadora explica que estas alterações podem manifestar-se através de perda de audição (que se revela tardiamente) ou de uma sensação de “som abafado” e longínquo, provocada pela presença de secreções no ouvido médio.
Estas disfunções dificilmente são detetadas por pais e professores, mas podem ter um impacto negativo na aprendizagem escolar. “No processo de aprendizagem da leitura, é essencial ter uma audição clara”, frisa Margarida Serrano, acrescentando que “a deteção precoce destes problemas é essencial para um desempenho académico de sucesso”.
Cerca de 91% das crianças observadas pelo otorrinolaringologista no local do rastreio foram encaminhadas para uma avaliação hospitalar formal, uma vez que foram confirmadas patologias ou necessidades de saúde que exigiam intervenção médica.
“Estes dados demonstram, uma vez mais, a importância da realização de rastreios audiológicos em cuidados de proximidade”, frisa Margarida Serrano, lembrando o impacto que as dificuldades audiológicas não detetadas podem representar a longo prazo. “Um estudo recentemente publicado na revista Lancet mostra que a baixa literacia é o principal fator de risco de declínio cognitivo em idade jovem”, aponta. “O papel do audiologista é fundamental para despistar eventuais problemas audiológicos, que comprometem a aprendizagem à entrada no ensino básico e, consequentemente, a capacidade cognitiva no futuro”, defende.
Desde 2007 que, anualmente, a ESTeSC-IPC colabora com a associação Coração Delta, realizando rastreios audiológicos a todas as crianças que ingressam no 1º ano de escolaridade no concelho de Campo Maior. O protocolo prevê a realização de três avaliações: otoscopia (para analisar a presença de cerúmen), timpanograma (para avaliar a membrana timpânica e o ouvido médio) e rastreio de audição. Todas as crianças que apresentam algum tipo de desvio são, imediatamente, observadas por um otorrinolaringologista, presente no local.
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