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África está a “partir-se” e pode nascer um novo oceano

NOTÍCIAS DE COIMBRA | 3 horas atrás em 21-07-2025

Nos desertos escaldantes da África Oriental, o solo está a desintegrar-se lentamente — um drama geológico que se desenrola em câmara lenta. Ao longo de milhões de anos, o continente africano irá dividir-se em dois, e os cientistas afirmam que um novo oceano preencherá essa fenda.

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A região de Afar é conhecida por ser um dos locais mais quentes e inóspitos da Terra. Mas para os geólogos, o que verdadeiramente interessa está escondido sob o solo abrasador. Afar situa-se na intersecção de três placas tectónicas — a Núbia, a Somália e a Arábica — que se afastam gradualmente umas das outras. Este processo, conhecido como rifteamento, está a remodelar a paisagem e oferece aos cientistas uma rara oportunidade de observar como os continentes se partem e como nascem os oceanos.

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“Este é o único lugar na Terra onde se pode estudar a transição de uma fenda continental para uma fenda oceânica”, explicou Christopher Moore, estudante de doutoramento na Universidade de Leeds, que utiliza radar de satélite para monitorizar a atividade vulcânica na região.

A região de Afar acolhe o Vale do Rift da África Oriental, uma enorme fissura que se estende pela Etiópia e Quénia. Em 2005, abriu-se uma fenda de 56 quilómetros no deserto etíope, com mais de 15 metros de profundidade e 20 metros de largura, conforme reportado pela National Geographic. Um vale de rifte refere-se a uma zona onde as placas tectónicas se rompem ou afastam.

“A divisão violenta foi o equivalente a centenas de anos de movimento das placas em apenas alguns dias”, afirmou Cynthia Ebinger, geofísica da Universidade de Tulane, que estudou a região durante anos.

As suas pesquisas indicam que o rifteamento não é um processo pacífico, mas sim marcado por eventos repentinos e explosivos. Ebinger compara o fenómeno a um balão a encher até rebentar, referindo que “estamos a tentar perceber qual é a gota de água que faz transbordar”. Estes eventos ocorrem devido à pressão do magma a subir do interior da Terra, que eventualmente faz a crosta rachar. Com o tempo, estas fissuras irão crescer, e o Golfo de Áden e o Mar Vermelho irão inundar a fenda, formando um novo oceano e dividindo a África em dois continentes: o continente menor incluirá a atual Somália e partes do Quénia, Etiópia e Tanzânia, enquanto o maior manterá o resto do continente.

“Uma fenda semelhante separou os continentes africano e sul-americano para formar o Oceano Atlântico, e esta fenda no leste de África pode ser o início de um processo igual”, acrescenta Christy Till, geóloga da Universidade Estadual do Arizona. “Trata-se de um fenómeno que ocorre muito lentamente, ao longo de milhões de anos.”

Durante décadas, os cientistas têm estudado a fenda africana, mas a tecnologia moderna revolucionou a forma como se acompanham estes movimentos. Equipamentos de GPS permitem medir com grande precisão o movimento das placas tectónicas.

“Com medições de GPS é possível detetar movimentos de alguns milímetros por ano”, explica Ken Macdonald, geofísico marinho e professor emérito da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara. A placa Arábica afasta-se da África a uma velocidade de cerca de 2,5 cm por ano, enquanto as placas Núbia e Somália se afastam mais lentamente, entre 1,2 cm e 5 cm por ano. Embora estes movimentos pareçam insignificantes, ao longo de milhões de anos irão transformar completamente a região.

À medida que as placas se afastam, material do interior da Terra sobe à superfície, formando nova crosta oceânica. “Podemos observar o início da formação da crosta oceânica, que é claramente diferente da crosta continental em termos de composição e densidade”, explica Christopher Moore.

Os cientistas estimam que levará entre 5 a 10 milhões de anos para que a região de Afar fique totalmente submersa. Quando isso ocorrer, o Golfo de Áden e o Mar Vermelho irão inundar a fenda, formando uma nova bacia oceânica e transformando o Chifre de África num pequeno continente separado.

Por agora, Afar permanece um ambiente hostil, com temperaturas diurnas que podem chegar aos 54 graus Celsius e que só descem até aos “amenos” 35 graus à noite. No entanto, para investigadores como Ebinger, este é um laboratório natural único que oferece valiosos insights sobre as forças que moldam o nosso planeta. “Já foi chamado o inferno de Dante”, afirma. “Mas para quem está disposto a suportar o calor, é uma janela para o futuro geológico da Terra — um futuro onde a África deixará de ser um só continente para se tornar dois, separados por um novo oceano.”

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