O Tribunal de Loures condenou um padre a cinco anos de prisão efetiva e a tesoureira a quatro anos e meio, por crimes de abuso de confiança, num processo que envolveu o desvio de mais de 800 mil euros de instituições de solidariedade social dos concelhos de Loures e Odivelas. As penas ainda admitem recurso.
O sacerdote liderava a Casa do Gaiato de Lisboa e outras cinco instituições sociais cuja missão era apoiar os mais pobres e desfavorecidos. Segundo ficou provado em tribunal, durante vários anos, o padre e a tesoureira aproveitaram os cargos que exerciam e o acesso às contas bancárias para se apropriarem de fundos das IPSS.
De acordo com a acusação do Ministério Público, entre 2007 e março de 2016, o dinheiro desviado foi utilizado para fins pessoais, incluindo a compra de um Porsche Panamera, um barco, uma vivenda em Peniche, vestuário de luxo e viagens internacionais. O tribunal deu como provada a existência de uma relação pessoal entre os dois arguidos, apontada pelo MP como um dos fatores do esquema.
O caso começou a ser investigado pela Polícia Judiciária em 2014 e teve um ponto de viragem em 2016, com a detenção do sacerdote. Desde então, o padre afastou-se de todas as funções e deixou de exercer qualquer cargo pastoral.
Na sentença, conhecida no dia 12 deste mês, o tribunal considerou provados apenas os crimes de abuso de confiança, tendo absolvido os arguidos do crime de branqueamento de capitais, pode ler-se no Correio da Manhã.
Apesar disso, o casal foi ainda condenado ao pagamento de indemnizações cíveis superiores a 2,6 milhões de euros. Segundo a decisão judicial, mais de 513 mil euros terão de ser pagos à Associação Protetora Florinhas da Rua e cerca de 560 mil euros ao Centro Comunitário e Paroquial da Ramada.
Foi igualmente declarado perdido a favor do Estado o montante de 1,6 milhões de euros, correspondente a vantagens económicas obtidas com os desvios, valor que os dois arguidos terão também de pagar.
Um dos elementos centrais do processo foi a compra de um Porsche Panamera, no valor de 167 mil euros, adquirido em agosto de 2010. A entrada de 10 mil euros foi paga com um cheque do Instituto Sãozinha, assinado pela tesoureira.
Na altura da investigação, o padre negou irregularidades. “Nunca fiz uma transferência de dinheiro. E se houve alguma falha ou trapalhada na gestão da Casa do Gaiato não foi intencional”, afirmou em março de 2016, após ser detido e libertado. Quanto ao automóvel, garantiu: “Já conduzi muito Porsche, mas não eram meus”, versão contrariada pela investigação.
Entre as instituições afetadas pelos desvios estão a Casa do Gaiato de Lisboa, o Instituto de Beneficência Maria da Conceição Ferrão Pimentel (Sãozinha), o Centro Comunitário e Paroquial da Ramada, a Fábrica da Igreja da Paróquia da Ramada, a Associação Protetora Florinhas da Rua e a ONG Ligar à Vida.
Só o Instituto Sãozinha, que geria uma creche e um jardim de infância para crianças em risco e com deficiência, recebeu cerca de 2,5 milhões de euros da Segurança Social entre 2008 e 2014.
O tribunal considerou que os factos representaram uma grave violação da confiança pública, lesando instituições destinadas à proteção dos mais vulneráveis e comprometendo a sua missão social.
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