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“Autênticos dilúvios” mataram mais de 230 pessoas há um ano em Espanha

Notícias de Coimbra com Lusa | 4 horas atrás em 27-10-2025

Imagem: DR

“Autênticos dilúvios, similares a uma monção” caíram há um ano no interior da região de Valência, Espanha, e acabaram por matar mais de 230 pessoas, vítimas dessas “quantidades extraordinárias” de água mas também de outros fatores.

“Desenrolou-se tudo da pior maneira possível” e “é uma soma de vários fatores que explicam este desastre”, disse à Lusa o geógrafo Samuel Biener, perito da plataforma de serviços meteorológicos e divulgação Meteored e colaborador do Laboratório de Climatologia da Universidade de Alicante, também na região autónoma da Comunidade Valenciana.

Em 29 de outubro de 2024, uma “gota fria” ou DANA, como é conhecida em Espanha uma “depressão isolada em altos níveis”, formou-se no sul da Península Ibérica, “coincidindo com uma entrada de ventos marítimos” e afetou sobretudo regiões do leste e do sul de Espanha, explicou Samuel Biener.

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“Quando temos esta situação e, além disso, o Mediterrâneo está quente, coisa que se tornou habitual nos últimos anos, temos todos os ingredientes necessários para se gerarem chuvas de grande intensidade. Em determinadas zonas, a interação com as montanhas faz com que estas chuvas, além de terem grande intensidade, se mantenham no mesmo lugar”, indicou.

Em localidades como Turís caíram perto 800 milímetros de chuva por metro quadrado em 24 horas, “dos valores mais elevados desde que há registo na Europa”, acrescentou.

Foram “quantidades extraordinárias” de água que se concentraram sobretudo no interior da região e não na costa, onde praticamente não choveu, mas onde acabou por morrer a maioria das pessoas, apanhadas de surpresa.

A água que caiu no interior de Valência, “autênticos dilúvios, similar a uma monção”, desceu em direção à costa por barrancos e ribanceiras e invadiu estradas e ruas de vários subúrbios da cidade de Valência ao final da tarde de 29 de outubro, numa hora de regresso a casa de milhares de pessoas depois do trabalho.

Morreram nas inundações e no temporal 229 pessoas na Comunidade Valenciana, sete numa zona vizinha da região de Castela La Mancha e uma na Andaluzia (sul de Espanha), segundo dados oficiais.

A agência nacional de meteorologia de Espanha (Aemet) tinha acionado um aviso vermelho de chuvas desde as 07:00 da manhã para a região de Valência, mas só às 20:11 as populações receberam nos telemóveis um alerta da proteção civil, tutelada pelos governos regionais.

Segundo a investigação judicial aberta para apurar as responsabilidades pela morte de 229 pessoas em Valência, a maioria das vítimas morreu antes de o alerta ter chegado.

Foi nas localidades em redor do Barranco do Poyo que houve mais mortes. Durante boa parte do ano nem sequer passa água neste percurso, mas em 29 de outubro do ano passado, por causa das “chuvas tão extremas e concentradas” que houve no interior, “o caudal do Danúbio passou por este pequeno barranco”, explicou Samuel Biener.

O pequeno barranco do Poyo transbordou, com a força das águas a arrastar carros, a entrar em todas as garagens e andares inferiores, a destruir pontes, estradas e até linhas de metro e comboio, com “caudais históricos” e as zonas inundadas e com maior destruição a serem das de maior densidade populacional em Espanha, sublinhou Samuel Bienier.

O geógrafo destacou que nas zonas do Mediterrâneo em Espanha, onde “são frequentes episódios de chuvas torrenciais”, a população “aumentou de forma espetacular nas últimas décadas” e houve construção sobre antigos leitos de rios, barrancos e albufeiras, assim como intervenções em cursos de água para os alterar.

“Quanto temos chuvas tão intensas, estes elementos que tinham desaparecido voltam a recuperar a sua função original e as águas tendem a recuperar o seu caminho natural”, afirmou Samuel Bienier, licenciado em Geografia e Ordenamento do território e mestre em Planeamento e Gestão de Riscos Naturais pela Universidade de Alicante.

Para o perito, é essencial que a reconstrução e recuperação das zonas e infraestruturas afetadas não se faça da mesma forma e que mude “a gestão de emergências de Espanha e da Europa”.

“Porque que estes fenómenos, infelizmente, vão ser mais habituais devido às alterações climáticas”, afirmou Samuel Biener, defendendo que é preciso “educar as populações para saberem como têm de atuar nestas situações”.

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