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Botânico Jorge Paiva reúne em livro 100 plantas da obra épica e lírica de Camões

Notícias de Coimbra | 3 horas atrás em 15-09-2025

Cerca de 100 plantas de vários continentes mencionadas por Camões na sua obra levaram o botânico Jorge Paiva a reconstituir em livro, disponível a partir de terça-feira, as viagens realizadas pelo poeta, no século XVI, entre Lisboa e o Extremo Oriente.

Luís de Camões estudou primeiro em Coimbra, de cuja Universidade Jorge Paiva é professor jubilado, antes de partir para Norte de África, Ilha de Moçambique, Goa e Macau, período que parcialmente coincide com a saga dos navegadores portugueses, algumas décadas depois de a armada de Vasco da Gama chegar à Índia, em 1498.

“Como ‘Os Lusíadas’ foram escritos, quase na sua totalidade, no Oriente e centrados nos Descobrimentos, grande parte das plantas referidas neste poema são asiáticas, particularmente especiarias e medicinais”, explica o cientista, que completa 92 anos na quarta-feira.

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Na terça-feira, o livro “As plantas na obra poética de Camões”, resultado de uma investigação de vários anos, “vai ser disponibilizado em acesso aberto no ‘site’ da Imprensa da Universidade de Coimbra (IUC)”, disse hoje à agência Lusa a diretora da instituição, Carlota Simões.

No estudo, com 166 páginas, o biólogo afirma, por outro lado, que na lírica de Camões, “maioritariamente escrita em Portugal e centrada no amor e paixão, as plantas referidas são, quase na totalidade, europeias, mediterrânicas e, geralmente, utilizadas pelos poetas desde a Antiguidade Clássica”.

“Algumas expedições botânicas em que participei [um pouco por todo o mundo] coincidiram com algumas das regiões por onde Camões andou ou alude nos seus poemas”, esclarece.

Estando a decorrer as comemorações oficiais dos 500 anos do nascimento do criador de “Os Lusíadas”, que tem como comissário o camonista José Augusto Bernardes, da Universidade de Coimbra, a edição do trabalho de Jorge Paiva está prevista no programa desde o início.

“Na época em que Camões viveu, as plantas mais conhecidas e citadas na literatura eram mais as plantas medicinais do que as alimentares e, na poesia, as ornamentais ou com relevância mitológica”, escreve.

Em “Os Lusíadas”, segundo o ambientalista, são referidas cerca de 60 plantas, “muitas asiáticas e aromáticas”, ao passo que na obra lírica surgem “muito menos espécies”, à volta de 40, sobretudo “europeias, campestres ou ornamentais”.

“Camões conhecia bem as plantas medicinais asiáticas utilizadas por Garcia de Orta, não só através da leitura dos ‘Colóquios [dos Simples e Drogas da Índia’], como também por as observar vivas na natureza. Além disso, (…) conhecia certamente o horto de Garcia de Orta, em Goa”, admite.

O investigador, nascido em Angola, em 1933, adianta que, “durante a sua estada na Ásia, particularmente em Goa, Camões, além dos conhecimentos botânicos e de fitoterapia conseguidos através do convívio com Garcia de Orta, seguramente teve oportunidade de convívios culturais com portugueses ilustres e cultos” que na altura residiam na colónia, anexada pela União Indiana, em 1961.

Em “As plantas na obra poética de Camões”, Jorge Paiva também interpreta referências a árvores, ervas e flores originárias de terras que o poeta-soldado nunca visitou, como o Brasil e Timor.

“Os portugueses quando viram o pau vermelho asiático, chamaram-lhe também pau-brasil, mas trata-se da madeira de uma árvore das florestas tropicais da Ásia Oriental”, exemplifica.

Para Carlota Simões, Jorge Paiva “reúne várias características que o tornam uma figura ímpar na ciência portuguesa”.

“Além da sua longevidade e bem conhecida vitalidade, tem um conhecimento profundo (…) na área da botânica, a que se junta uma invulgar disponibilidade em colaborar com colegas de áreas muito distintas”, disse à Lusa a diretora da IUC.

No poema épico, Camões “idealizou uma ilha coberta de floresta, com lagos, rios e formosos outeiros” – a Ilha dos Amores – para cantar “um encontro idílico entre a tripulação capitaneada por Vasco da Gama e deusas da mitologia grega”.

“Esteve não só em ilhas do oceano Índico como, também, em algumas ilhas tropicais asiáticas do oceano Pacífico, cobertas de floresta tropical húmida”, relaciona Jorge Paiva.

Camões passou ainda pelas ilhas atlânticas Terceira, Santa Helena e Tristão da Cunha, além de outras no Índico, como a ilha de Moçambique, evidencia.

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