Vamos

Coimbra Recebe o Teatro do Invisível de Koohestani

Notícias de Coimbra | 8 minutos atrás em 11-09-2025

O dramaturgo e encenador Amir Reza Koohestani trabalha quase sempre a partir do quotidiano e é no dia-a-dia, para lá do que se vê à tona da sociedade iraniana, que encontra fome de mudança no seu país.

“Talvez haja uma mudança, mas há, sobretudo hoje, fome por mudança”, disse à agência Lusa o criador iraniano, que dirige este ano o École des Maîtres, projeto internacional de formação avançada, que viaja por quatro países europeus, com a participação de jovens atores, e que tem hoje uma apresentação, no Teatro Académico de Gil Vicente, em Coimbra, do processo em construção no âmbito desse curso itinerante.

O dramaturgo está radicado na Alemanha, depois de ter saído do Irão em 2018, mas mantém um contacto com jovens criadores de teatro em Teerão, considerando que o que lhe faz ter esperança quanto ao futuro sobre uma possível mudança, não se encontra à superfície da sociedade.

PUBLICIDADE

“Há coisas que estão a acontecer que não se veem nos media, mas nas casas, na vida diária”, notou, referindo que nas reuniões que mantém com 12 dos seus antigos alunos da Universidade de Teerão, apenas três são homens.

Para Amir Reza Koohestani, as mulheres iranianas estão “muito mais ativas” e assumem cada vez mais papéis como criadoras artísticas, à procura de dar voz a pessoas e comunidades que não a têm.

“Nós hoje temos mais estudantes mulheres do que homens e isso dá-me esperança”, notou, vincando a admiração pelas suas colegas que encontram caminhos numa sociedade bastante patriarcal.

Se as mudanças que se veem no Irão são sobretudo em espaços fechados e em momentos do quotidiano, é também aí que interessa a Amir Reza Koohestani trabalhar.

Com início de carreira no cinema, o dramaturgo afirmou-se ao longo das últimas duas décadas como uma das principais vozes do teatro iraniano, num trabalho sempre atento aos pequenos gestos e ações do dia-a-dia, onde diz encontrar política e muito drama – para isso, basta “olhar com outra perspetiva”, conta.

No exercício, que é apresentado hoje, às 18:30, em Coimbra, será trabalhado também esse olhar sobre o quotidiano, numa mistura com os segundos atos de cinco peças de Tchekhov, dramaturgo russo que explora a performance a partir de gestos aparentemente banais da vida diária.

“Eu sempre senti a ausência de algumas das nossas experiências diárias no teatro, aquela que é a nossa luta diária. Pensa-se no teatro político falando de políticos ou de Trump, mas pode-se falar das compras que fazemos na internet para fugir aos problemas ou do lugar de espera como lugar de consumo”, notou.

Sobre isso, apontou para a viagem que o grupo fez da Bélgica para Portugal e da espera no aeroporto que é transformada, por um momento, para se comprar “coisas inúteis” enquanto se aguarda pela indicação da porta de embarque do avião.

“A espera é intolerável para nós. Por isso, temos sempre um telefone ao nosso lado para o caso de alguém estar atrasado e ficarmos no Instagram a matar o tempo. Então, eles não anunciam a porta de embarque para obrigar as pessoas a esperar e a gastar dinheiro”, constatou.

Nesse sentido, entende a vida quotidiana como uma impressão digital, um reflexo da individualidade de cada um, mas que ao mesmo tempo reflete sobre experiências que acabam por ser universais.

Questionado sobre a sua condição de exilado e sobre o caminho que a Europa toma, Amir Reza Koohestani aponta para a frustração de “alguém que vai para um sítio onde pensa que tem uma forma ou algo parecido com a ideia de liberdade, mas que depois precisa de lutar por mais ou menos a mesma coisa, na Alemanha, que estava a lutar no Irão”.

“Tornou-se quase impossível ter uma pequena discussão política simples, até no teatro, que deveria ser o lugar mais seguro para uma discussão política e isso é triste. Como artistas, como cidadãos, temos de exigir os espaços que nos foram tirados”, afirmou.

PUBLICIDADE

publicidade

PUBLICIDADE