Um estudo recente realizado em Lisboa revela que os carros estacionados, especialmente os de cor escura, podem contribuir significativamente para o aumento da temperatura do ar nas ruas, criando pequenas “ilhas de calor” móveis.
A investigação foi conduzida pela geógrafa Márcia Matias e publicada na revista City and Environment Interactions.
Durante um ensaio realizado num dia quente de verão, Matias estacionou dois veículos — um preto e outro branco — sob luz solar direta durante várias horas. As medições revelaram que o ar junto ao carro preto estava até 3,8°C mais quente do que o asfalto abaixo dele, enquanto o carro branco teve um efeito muito menor.
PUBLICIDADE
“Quando passa por um carro estacionado num dia quente e sente o calor irradiando dele, isso não é imaginação. É real!”, afirmou Matias, citada pelo New Scientist.
O estudo explica que a diferença se deve à física das cores: a tinta preta reflete apenas 5 a 10% da luz solar, enquanto a branca chega a refletir 85%. Além disso, a chapa metálica dos carros aquece rapidamente e irradia calor para o ar circundante, criando micro ilhas de calor que, multiplicadas por dezenas ou centenas de milhares de veículos, podem alterar a temperatura de bairros inteiros.
Em Lisboa, os investigadores contabilizaram mais de 91.000 lugares de estacionamento na rua e mais de 700.000 carros em circulação durante um dia típico. A análise demonstrou que, em áreas onde os carros escuros ocupam mais de 10% da superfície viária, a substituição por veículos claros poderia aumentar a refletividade solar em até 19 pontos percentuais, diminuindo de forma significativa o aquecimento urbano.
Matias sugere medidas simples para mitigar o problema: “Frotas municipais, táxis e veículos de entrega são candidatos óbvios para receberem uma reforma com cores claras. Pequenas alterações podem trazer grandes benefícios na redução do calor urbano.”
A pesquisa desafia a forma como se modela tradicionalmente o clima urbano, mostrando que os carros — mesmo estacionados — são fatores ativos na modulação da temperatura nas cidades. Estruturas de sombra, revestimentos refletivos e incentivo ao uso de cores claras podem ser soluções eficazes e de baixo custo.
Sarah Berk, investigadora climática da Universidade da Carolina do Norte, considera a abordagem inovadora: “Enquanto muitas estratégias focam em telhados e pavimentos, utilizar veículos estacionados como uma forma de mitigação do calor urbano é particularmente original.”
O estudo alerta que, com o aumento das temperaturas e a densidade de veículos nas cidades, medidas simples como a escolha da cor dos carros podem ter um impacto real na experiência térmica dos cidadãos.
PUBLICIDADE