Saúde

Inteligência Artificial consegue detetar cancro na voz antes dos médicos

NOTÍCIAS DE COIMBRA | 4 horas atrás em 12-08-2025

Todos nós já tivemos dias em que a voz fica rouca, seja depois de uma constipação, de um concerto ou de uma noite animada no estádio. Normalmente, descanso e chá são suficientes para recuperar. Contudo, para algumas pessoas, a rouquidão persiste.

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Esse chiado constante pode ser um sinal precoce de cancro da laringe. O prognóstico varia, com taxas de sobrevivência entre 35% a 78% ao fim de cinco anos quando tratado, sendo a deteção precoce o fator mais importante.

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Atualmente, os métodos padrão para diagnóstico são a endoscopia nasal ou a biópsia. Ambos são invasivos, desconfortáveis e só são recomendados após o aparecimento de sintomas ou deteção de anomalias evidentes — o que pode atrasar o diagnóstico e permitir que o cancro evolua. Agora, investigadores demonstraram que anomalias relacionadas com o cancro da laringe podem ser detetadas por inteligência artificial (IA) a partir de gravações de voz.

“O reconhecimento precoce e não invasivo destas lesões, utilizando a voz como biomarcador, pode melhorar o acesso ao diagnóstico e os resultados clínicos. Neste estudo, analisámos dados da versão inicial do conjunto de dados Bridge2AI-Voice para avaliar quais as características acústicas que melhor distinguem o cancro da laringe e as lesões benignas das pregas vocais de outras patologias e da voz saudável”, escrevem os autores do estudo.

O projeto ‘Bridge2AI-Voice’ faz parte do consórcio ‘Bridge to Artificial Intelligence’ (Bridge2AI) do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, uma iniciativa para aplicar IA a desafios biomédicos complexos.

“Mostrámos que, com este conjunto de dados, conseguimos usar biomarcadores vocais para distinguir vozes de pacientes com lesões nas pregas vocais daqueles sem essas lesões”, explicou o Dr. Phillip Jenkins, investigador de pós-doutoramento em informática clínica na Oregon Health & Science University e autor correspondente do estudo.

Este trabalho integra um movimento crescente na medicina de usar sinais do quotidiano como biomarcadores ocultos. Por exemplo, a marcha pode indicar risco de Parkinson, a tosse pode revelar COVID-19, e agora a voz pode conter os primeiros indícios de cancro.

No estudo foram analisadas 12.523 gravações de voz de 306 participantes na América do Norte, incluindo pacientes com cancro da laringe, lesões benignas nas pregas vocais, disfonia espasmódica e paralisia unilateral das pregas vocais.

Os investigadores focaram-se em parâmetros acústicos da voz como a frequência fundamental média (tom), jitter, variação de tom, shimmer e a relação harmónico-ruído (HNR). Curiosamente, não encontraram características acústicas relevantes nas mulheres, enquanto nos homens a frequência fundamental e a relação harmónico-ruído foram os dados mais informativos.

Encontraram diferenças significativas na HNR e na frequência fundamental entre homens sem distúrbios vocais, homens com lesões benignas e homens com cancro da laringe. Os autores consideram que um conjunto de dados maior poderá revelar diferenças também nas mulheres.

“O estudo sugere que a HNR, especialmente a sua variabilidade, pode ser um marcador promissor para a deteção e monitorização precoce de lesões nas pregas vocais. São necessárias mais investigações com populações maiores e diversificadas para validar a sua utilidade clínica”, referem os investigadores.

“Nossos resultados indicam que conjuntos de dados grandes, multi-institucionais e éticos, como o Bridge2AI-Voice, podem tornar a voz num biomarcador prático para o risco de cancro nos cuidados clínicos”, afirmou Jenkins.

Por agora, trata-se apenas de uma prova de conceito. O próximo passo é testar os algoritmos com mais dados e em diferentes contextos clínicos.

Para isso, os investigadores precisam de recolher mais gravações, sobretudo de mulheres. “Para avançar para uma ferramenta de IA capaz de reconhecer lesões nas pregas vocais, treinaremos modelos com um conjunto de dados maior, rotulado por profissionais, e depois testaremos para garantir eficácia para ambos os sexos”, explicou Jenkins.

“Ferramentas baseadas na voz já estão a ser testadas. Com base nestes resultados, prevejo que, com mais dados e validação clínica, ferramentas similares para detetar lesões nas pregas vocais possam ser testadas em piloto nos próximos dois anos”, concluiu.

Se aperfeiçoada e validada, esta tecnologia poderá facilitar muito a triagem precoce: uma breve gravação de voz poderia integrar check-ups rotineiros ou até aplicações móveis, sinalizando a necessidade de exames mais detalhados antes do agravamento dos sintomas.

No caso do cancro da laringe, isto poderá significar detetar a doença em segundos de fala, em vez de após meses de rouquidão.

O estudo foi publicado na revista Frontiers in Digital Health.

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