Opinião

Os comentadores que comentam os comentadores

OPINIÃO | PEDRO SANTOS | 14 horas atrás em 11-05-2025

Em Portugal, o jornalismo político – em particular o televisivo – transformou-se num exercício que causa perplexidade, em que comentadores escrutinam as análises de outros comentadores, que depois são comentados ainda por outros comentadores, não sem que também estes comentários sejam discutidos por ainda outra leva de comentadores… uma espécie de pescadinha-de-rabo-na-boca-que-comenta.

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Assim é criada uma realidade paralela que pouco ou nada reflete o país real. E como fator de agravamento, a busca por conteúdo constante leva a comunicação social a baixar o nível de exigência e encher os seus painéis com figuras que, muitas vezes, têm ligações diretas aos partidos políticos que deveriam escrutinar. Estes comentadores, frequentemente apresentados como analistas independentes, promovem invariavelmente agendas partidárias disfarçadas de opinião imparcial. O resultado é uma cacofonia que reforça narrativas que lhes são convenientes, impossibilitando o surgimento de uma verdadeira discussão que permita criar consensos ou determinar verdadeiras linhas de separação. 

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Além disso, a obsessão com sondagens, que têm falhado repetidamente em prever resultados eleitorais, ou com tracking polls, que por definição não servem sequer para o fazer, alimenta uma cobertura baseada em especulações e cenários hipotéticos. Estas ferramentas acabam por não fazer mais do que moldar perceções e influenciar decisões de voto.

Assim nos é servido um modelo de cobertura política que cria uma série de problemas contrários à democracia, como a desinformação – com a repetição incessante de análises superficiais e enviesadas, que confundem o público e obscurecem questões fundamentais –, a polarização – a amplificação de vozes partidárias e minimização de perspetivas independentes ajuda a criar uma sociedade mais dividida – e a manipulação do eleitorado – a perceção de uma determinada realidade leva a votar estrategicamente ou a abster-se, muitas vezes com base em informações distorcidas.

Para preservar a integridade da democracia, é urgente repensar o papel do jornalismo. Isso implica diversificar as vozes presentes nos debates, promover análises baseadas em dados concretos e contextos reais, e, acima de tudo, restaurar o compromisso com a verdade. A democracia não pode prosperar num ambiente mediático onde a opinião suplanta os factos e onde os comentadores se tornam os protagonistas de uma narrativa que deveria ser centrada nos cidadãos e nas suas realidades.

OPINIÃO | PEDRO SANTOS – ESPECIALISTAS EM COMUNICAÇÃO

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