Joy Milne, uma antiga enfermeira escocesa, pode estar a mudar o rumo da luta contra a doença de Parkinson graças a uma capacidade invulgar: alega conseguir cheirar a doença anos antes de ser diagnosticada.
A descoberta teve início há quase duas décadas, quando Joy, então com 45 anos, começou a notar um odor diferente e persistente no marido. Era um cheiro almiscarado e ceroso que ninguém mais parecia notar e que a deixava inquieta. Anos mais tarde, quando Les recebeu o diagnóstico de Parkinson, as peças começaram a encaixar-se. O cheiro não era imaginação — era um sinal precoce da doença.
Desde então, Joy percebeu que aquele aroma peculiar estava presente noutras pessoas com o mesmo diagnóstico. Dotada de hiperosmia, uma condição rara que intensifica o sentido do olfato, ela afirma ser capaz de distinguir diferentes doenças apenas pelo cheiro. “É o meu superpoder”, disse numa palestra TEDx, referindo-se à sua sensibilidade excecional.
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O caso de Joy poderia ter passado despercebido, não fosse o encontro com a professora Perdita Barran, da Universidade de Manchester. Curiosa, a investigadora propôs-lhe um teste: identificar, apenas pelo cheiro, t-shirts usadas por pessoas com Parkinson e outras por indivíduos saudáveis. Joy acertou em quase todas. Uma única t-shirt foi classificada erroneamente — mas, nove meses depois, a pessoa que a usara foi diagnosticada com a doença. Joy não tinha apenas identificado casos existentes… tinha detetado a doença antes dos sintomas.
A colaboração entre Milne e Barran evoluiu para uma investigação científica ambiciosa: desenvolver o primeiro teste de zaragatoa cutânea que consiga detetar Parkinson de forma precoce e não invasiva. A chave está no sebo — a substância oleosa que a pele segrega — que sofre alterações químicas nas pessoas com a doença, relata a ZME Science.
Através de análises sofisticadas ao sebo, a equipa identificou uma assinatura química complexa com dezenas de milhares de características moleculares. Cerca de 10% dessas diferenças são consistentes entre doentes com Parkinson, permitindo delinear um padrão bioquímico específico. Embora não exista uma “molécula do Parkinson”, a combinação de compostos — incluindo o ácido octadecanoico — cria um perfil olfativo único que Joy é capaz de identificar sem recurso a máquinas.
A investigação, apoiada pela Fundação Michael J. Fox, está a desenvolver um teste que, além de eficaz, poderá colmatar falhas graves no diagnóstico, sobretudo em mulheres, cujos sintomas são muitas vezes confundidos com sinais da menopausa. Os ensaios iniciais mostram uma precisão de 96,7%, superando largamente os diagnósticos feitos por médicos de clínica geral.
Embora ainda não exista cura para o Parkinson, a deteção precoce abre portas a tratamentos mais eficazes e ao planeamento da vida com a doença. Para Joy Milne, cujo marido faleceu em 2015, o conhecimento antecipado teria feito toda a diferença. “Teria mudado tudo”, admite.
A investigação continua, e a equipa espera que este método possa ser adaptado para identificar outras doenças neurológicas ou cardiovasculares. Um futuro onde o cheiro do corpo possa contar histórias que os exames de sangue não revelam poderá estar mais próximo do que se pensa — e tudo graças ao nariz de uma mulher com um talento raro.
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