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Moçambique: Deslocados enganam a fome com folhas de feijão e sal

Notícias de Coimbra | 3 anos atrás em 01-04-2021

As folhas de feijão que crescem junto à casa precária em Pemba enganam a fome da família de 30 pessoas de Virgílio Chimuemue, 61 anos, deslocados da guerra em Cabo Delgado, norte de Moçambique.

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“Sem ajuda, fico muitos dias com sacrifício, só com essas folhas aí. Sempre cozinhamos e damos com sal. E as crianças comem assim mesmo. Folhas de feijão que eles sempre recolhem e comem”, descreve à Lusa.

Não há comida que chegue, “mas as crianças dormem melhor. As crianças podem brincar”, longe do som das armas dos grupos insurgentes que atacam a província há três anos e meio.

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O preço da segurança é a fome, porque Virgílio teve de largar as terras férteis de Muidumbe, onde sempre viveu a “culimar a machamba”, a arte de trabalhar a horta.

“Poupamos [os donativos] a comer uma vez por dia”, reservando sacos de farinha de milho para os mais novos, netos de Virgílio.

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“Verificamos as crianças e quando estão pior é quando vamos preparar”, diz, ao apontar para os sacos sob um abrigo de estacas e lonas onde tachos e panelas estão espalhados pelo chão arenoso.

Hoje é um dos dias em que os sorrisos se abrem para receber um apoio reforçado da Cáritas.

“Nestes sacos há feijão-nhembe, que coze mais rápido, porque sabemos que não têm carvão”, explica Betinha Ribeiro, da equipa de apoio humanitário que calcorreia numa viatura de caixa-aberta os caminhos impróprios do bairro Expansão.

Caminhos com tantas valas escavadas pela chuva que deixam longe um bairro colado à cidade.

Açúcar, esparguete, óleo, são luxos desta doação.

Lá está também o arroz que vai logo ao lume num tacho que servirá para todos.

“Aqui eu não tenho emprego, fico assim, sempre, um deslocado”, queixa-se Virgílio, sem dinheiro “para comprar comida”.

Outra associação religiosa, a Arco-Íris, também traz alimentos ocasionalmente à família, sem mais respostas de apoio, apesar de estar identificada.

“Só vêm aí, escrevem os nossos nomes, mas não trazem nada. Utilizam os nossos nomes de refugiados”, queixa-se Virgílio, sem conseguir perceber o que falha.

Do que tem a certeza, é que não pode voltar atrás.

“Andámos duas semanas no mato, sem comer”, durante a fuga de Muidumbe, em 2020, e essa é a pior das memórias.

Os sacos estão contados, o poço de onde a família se abastece com água potável está verificado e é hora de a equipa de apoio humanitário voltar a Pemba.

Há mais deslocados para receber, oriundos de Palma, alvo do mais recente ataque terrorista, a precisar de apoio alimentar que escasseia para responder a uma crise humanitária crescente em Cabo Delgado.

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