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Desta água não beberás?

Notícias de Coimbra | 9 anos atrás em 09-12-2014

Notícias de Coimbra revela a proposta que Manuel Machado preparou para ser votada na reunião de amanhã do executivo municipal de Coimbra, onde se pode ler que o líder da autarquia local recusa  que Coimbra  venha a aderir e a integrar o  Sistema Multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Centro Litoral de Portugal.

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PROPOSTA DE DELIBERAÇÃO
Considerando que:
a) O Município de Coimbra recebeu, a 27 de outubro de 2014, uma comunicação do Sr. Ministro do Ambiente e Ordenamento do Território a remeter o projeto de criação do Sistema Multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Centro Litoral de Portugal para efeitos da emissão de competente parecer fundamentado do município; e considerando o contexto daquela comunicação, tendo em conta que:

b) Os sucessivos Governos avançaram com a criação de Sistemas Multimunicipais (SMM) com posição maioritariamente concentrada na Águas de Portugal (AdP), a pretexto da “obtenção de economias de escala que garantam a sustentabilidade económica, social e ambiental dos serviços e preservando sempre a sua natureza pública”;

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c) Ao mesmo tempo assistiu-se a um conjunto de opções governamentais criando dificuldades e impedindo o acesso dos Municípios aos Fundos Comunitários essenciais para a construção e a manutenção de infra-estruturas dos serviços públicos de água e de saneamento, em “alta” nos seus concelhos;

d) O Município de Coimbra, que detinha a responsabilidade exclusiva da administração daqueles serviços públicos, através dos Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento de Coimbra (SMASC) sendo a sua gestão controlada e assegurada pelos Órgãos Autárquicos democraticamente eleitos, foi levado, em 2004, a aderir ao atual sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento, criado pelo Decreto-Lei n.º 172/2004, de 17 de julho, consentindo que uma parte da gestão e da exploração dos seus serviços fosse assegurada através da criação da sociedade gestora daquele sistema, a Águas do Mondego – Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e de Saneamento do Baixo Mondego – Bairrada, S.A.;  

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e) A origem dos atuais problemas de sustentabilidade dos sistemas que agora se propõe agregar, com as consequências que provocam no plano dos “clientes/municípios” a eles associados, reside, entre outros aspetos, na conceção do modelo associado aos SMM, numa filosofia de cobertura total dos custos com objetivos puramente financeiros, em Estudos de Viabilidade Económica e Financeira (EVEF) com valores base sobredimensionados, com taxas de comparticipação insuficientes de fundos comunitários, em investimentos adicionais não previstos e sem participação comunitária, bem como na imposição do recurso a outsourcing para a operação e a manutenção dos SMM;

f) As dificuldades financeiras dos municípios e os problemas de sustentabilidade do SMM resultam da ofensiva desencadeada contra os serviços e bens públicos de água e saneamento e contra a autonomia do Poder Local e tem conduzido à inevitável existência (e aumento) de défices tarifários, bem como ao aumento das tarifas muito para além da taxa de inflação, contrariamente ao que se previa nos Contratos de Concessão.

g) Este acometimento, aliás, tem sido concretizado pela progressiva edificação de um regime jurídico de enquadramento, de que se destacam:

§ A alteração da Lei de Delimitação de Setores, a criação dos SMM, o Plano Nacional e a Lei da Água, os regimes jurídicos dos sistemas municipais e intermunicipais;

§ A alteração da Lei de Finanças Locais e legislação complementar, designadamente por via dos privilégios creditórios e da consignação de 50% da receita da cobrança aos SMM (fatura detalhada);

§ As alterações aos Estatutos do Regulador, a ERSAR, definindo regras obrigatórias sobre tarifários que visam assegurar uma «harmonização» em alta das tarifas, com o fundamento da necessidade de “cobertura total dos custos” abrindo o caminho a uma privatização da AdP e numa intolerável intromissão na autonomia do Poder Local;

§ O total desrespeito pelos estatutos da sociedade gestora da atual empresa Águas do Mondego – Sistema Multimunicipal de Abastecimento de Água e de Saneamento do Baixo Mondego – Bairrada, S.A.;

§ A captação de fundos comunitários, concentrada na Águas de Portugal devido à sua posição maioritária nos SMM.
Considerando ainda que:

h) O presente projeto de Decreto-Lei visa a criação do Sistema Multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Centro Litoral de Portugal, por agregação de 3 Sistemas Multimunicipais, entre os quais o da Águas do Mondego que o Município de Coimbra integra, com o pretexto da “obtenção de economias de escala que garantam a
sustentabilidade económica, social e ambiental dos serviços e preservando sempre a sua natureza pública”, com as mesmas restrições de então no acesso dos municípios aos Fundos Comunitários, numa estratégia totalmente desenvolvida à margem e contra a vontade dos municípios, em confronto e no desrespeito pelo cumprimento dos pressupostos e dos acordos parassociais que os levaram a aderir ao atual SMM; 

i) O Código das Sociedades Comerciais que determina no Artigo 28.º (Verificação das entradasem espécie) que:

1 – As entradas em bens diferentes de dinheiro devem ser objecto de um relatório elaborado por um revisor oficial de contas sem interesses na sociedade, designado por deliberação dos sócios na qual estão impedidos de votar os sócios que efectuam as entradas.

2 – O revisor que tenha elaborado o relatório exigido pelo número anterior não pode, durante dois anos contados da data do registo do contrato de sociedade, exercer quaisquer cargos ou funções profissionais nessa sociedade ou em sociedades que com ela se encontrem em relação de domínio ou de grupo.

3 – O relatório do revisor deve, pelo menos:
a) Descrever os bens;
b) Identificar os seus titulares;
c) Avaliar os bens, indicando os critérios utilizados para a avaliação;
d) Declarar se os valores encontrados atingem ou não o valor nominal da parte, quota ou acções atribuídas aos sócios que efectuaram tais entradas, acrescido dos prémios de emissão, se for caso disso, ou a contrapartida a pagar pela sociedade.
e) No caso de acções sem valor nominal, declarar se os valores encontrados atingem ou não o montante do capital social correspondentemente emitido.

4 – O relatório deve reportar-se a uma data não anterior em 90 dias à do contrato de sociedade, mas o seu autor deve informar os fundadores da sociedade de alterações relevantes de valores, ocorridas durante aquele período, de que tenha conhecimento.
5 – O relatório do revisor deve ser posto à disposição dos fundadores da sociedade pelo menos 15 dias antes da celebração do contrato; o mesmo se fará quanto à informação referida no n.º 4 até essa celebração.

6 – O relatório do revisor, incluindo a informação referida no n.º 4, faz parte integrante da documentação sujeita às formalidades de publicidade prescritas nesta lei, podendo publicar-se apenas menção do depósito do relatório no registo comercial.

j) O presente projeto de Decreto-Lei retira ao Município a capacidade que hoje detém por direito próprio, de intervenção direta na gestão das infraestruturas do atual SMM, que constituiu e constitui um pressuposto determinante da sua adesão ao mesmo;

k) Atribui a uma entidade completamente alheia aos municípios a gestão do sistema e, para iludir a desvalorização e a diluição do papel de cada município, cria um designado “conselho consultivo” que, pelo seu caráter não vinculativo seria um mero órgão decorativo, sem qualquer intervenção na gestão direta do Sistema; 

l) Ignora o papel determinante dos Municípios no processo de infraestruturação do país em matéria de águas e saneamento, na cobertura das necessidades dos seus concelhos, na melhoria e conservação das redes, nos combates à redução de perdas, à subfacturação, à fraude e às ligações clandestinas, na utilização de água para fins compatíveis;

m) Aponta para a verticalização dos atuais sistemas agregados, assente num processo de pressão e de chantagem face às atuais dificuldades financeiras a que os municípios se encontram sujeitos, visando a alienação e entrega ao Sistema proposto com a agregação, das suas redes em “baixa”, com o objetivo já anunciado de criar condições para transformar a água pública e o serviço público de água num negócio de empresas privadas que, à margem dos interesses do Município e das suas populações, viriam impôr condições que lhes garantissem os lucros desejados à semelhança do que tem sucedido noutros setores da economia nacional e contrariamente às políticas municipais que definem tarifas sem fins lucrativos e com critérios económico-financeiros que têm em conta um grau adequado de cobertura de custos, a natureza social do serviço público e que contribuem para sustentar os atuais sistemas multimunicipais em que participam;

n) Afasta-se completamente de modelos de gestão que os municípios entendem dever ser adotados nesta área, no sentido de uma participação determinante e mais direta dos municípios na gestão do sistema, com medidas para os quais este município está disposto a contribuir;

o) Deixa antever ameaças à natureza e à prestação de um serviço público ao serviço das populações, do desenvolvimento dos concelhos, das regiões e do País, num processo em que a AdP, Águas de Portugal é maioritária nos SMM de água e saneamento, desenvolvido no desrespeito e à revelia das atribuições e competências do Poder Local, mas em tudo similar ao que tem sucedido com o processo que visa a privatização da Empresa Geral de Fomento, EGF,
maioritária nos SMM de resíduos;

p) Entrega à AdP da gestão delegada do novo Sistema, permitindo a esta passar para uma dimensão, em termos de utentes, significativa à escala europeia e sem quaisquer custos e, à custa dos municípios, o que lhe vai naturalmente dar mais hipóteses nos seus projetos de internacionalização e também, diga-se, no aumento dos apetites de usura numa futura privatização;

q) Aposta, quase exclusivamente, em três mecanismos para a sustentabilidade financeira do Sistema e para a resolução dos défices acumulados:

1. Alegado aumento da eficiência na gestão principalmente em razão de economias de escala o que, pela experiência dos sistemas a extinguir, com a dominância das Águas de Portugal, não avaliza muito;

2. Aumento progressivo das tarifas às entidades gestoras em baixa, da zona litoral do país, essa sim garantida por vários processos, sem nunca perder de vista a remuneração dos capitais próprios, passada e futura. Para os SIMAR, o aumento das tarifas, no final do primeiro quinquénio, situar-se-á em 14,22%, para o TAR e em 23,7% para as AA, sem que, em contrapartida, se vislumbre qualquer benefício; 

3. Alargamento real dos prazos das concessões agregadas, o que na Águas do Mondego se traduz em alargar unilateralmente o prazo da concessão dos bens municipais sem consentimento, nem, tão pouco estabelecer o diálogo negocial indispensável à competente deliberação dos órgãos autárquicos como impõe a lei.

r) A criação da nova sociedade, SA, com integração forçada dos municípios que não queiram vender as suas participações no capital social, viola a Constituição da República Portuguesa (art.º 235.º, n.º 2) e a Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, que atribui à Assembleia Municipal a competência de deliberar sobre a participação do município em sociedades comerciais;

s) A extinção da Águas do Mondego, SA, por decreto-lei, retira aos demais acionistas (o Estado apenas detém a maioria na sociedade), a possibilidade de pronúncia e exercício do direito de voto, mesmo que vencido, constituindo violação dos mais elementares princípios de boa-fé e de respeito pelas autarquias locais acionistas;

t) Ao contrário do que o Governo agora pretende impor ao considerar não vinculativo o parecer solicitado aos municípios, a criação e a concessão do Sistema Multimunicipal carece da legitimação de cada um e de todos os municípios que integrem o sistema, pelo que a emissão de apenas um parecer desfavorável, inviabiliza a criação do novo Sistema Multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Centro Litoral de Portugal;

u) Pela mesma ordem de razões se entende que a extinção prematura do Sistema Multimunicipal Águas do Mondego, para cuja criação foi exigida a anuência dos Municípios, dependerá também, naturalmente da anuência dos municípios que o constituem.

Tenho a honra de propor que:

A Câmara Municipal de Coimbra delibere ao abrigo da al. ccc) do n.º 1 do artigo 33.º do AnexoI da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, conjugado com o n.º 3 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 92/2013, de 11 de julho, submeter à aprovação da Assembleia Municipal de Coimbra a presente proposta de parecer fundamentado sobre o projeto de diploma para a criação do Sistema Multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Centro Litoral de
Portugal, nos termos seguintes:

1. Reiterar a sua firme rejeição do processo que levou à apresentação do presente projeto de Decreto-Lei, desenvolvido no desrespeito e à revelia das atribuições e competências do Poder Local;

2. Manifestar o seu parecer negativo e, em consequência, a sua total recusa em aderir e integrar o proposto Sistema Multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Centro Litoral de Portugal;

3. Não dar a sua anuência à extinção prematura do atual SMM e da respetiva sociedade gestora, a Águas do Mondego, S.A., e exige o cumprimento dos pressupostos que o levaram a aderir a este Sistema e a concretização das medidas adequadas e insistentemente reclamadas pelos municípios, nomeadamente: 

3.1. A redução substancial dos elevados e injustificados valores do fee de gestão e dos fluxos financeiros do atual SMM para a AdP, Águas de Portugal;

3.2. A eliminação do inadmissível valor da actual remuneração de capitais no sistema público;

3.3. A revisão e renegociação do Estudo de Viabilidade Económica e Financeira (EVEF), tendo em conta o histórico e a realidade do atual SMM;

3.4. O cumprimento de responsabilidades por parte do concedente (Estado) na sustentabilidade do atual SMM e nos pressupostos de adesão do município ou a recolocação de competências na esfera dos municípios, aplicando os princípios dos sistemas de titularidade municipal em vez dos sistemas de titularidade estatal;

3.5. A implementação de uma estrutura tarifária adequada à realidade económica e social dos territórios dos municípios, com tarifas atualizadas, no limite, à taxa de inflação;

3.6. O aumento das comparticipações comunitárias.

4. Exigir que se tenha em conta o papel determinante dos municípios em todo o processo de reestruturação do setor da água e do saneamento.

5. Reafirmar que, para este município, o parecer negativo agora emitido tem caráter vinculativo, pelo que, no caso do mesmo ser desrespeitado, o município reitera a sua firme determinação de desenvolver todas as ações ao seu alcance, no plano institucional, político e judicial, para impedir a concretização do presente projeto de Decreto-lei, na defesa intransigente das populações, do serviço público de água e saneamento e da autonomia do Poder Local.

Coimbra, 4 de Dezembro de 2014
O Presidente da Câmara
(Manuel Machado)

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