Justiça

Covid-19: Tráfico de pessoas diminuiu em 2020, mas está a “voltar à realidade”

Notícias de Coimbra com Lusa | 3 anos atrás em 27-07-2021

O tráfico de seres humanos diminuiu em 2020, devido às medidas de conteção da covid-19, mas já há indícios de que está a “voltar à realidade” pré-pandemia, segundo o procurador da República Miguel Ângelo do Carmo.

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“Até final do ano, vamos voltar à realidade antes da pandemia”, estimou o procurador, orador no debate sobre tráfico de seres humanos promovido hoje pela Assembleia da República.

A previsão decorre dos dados já disponíveis para o primeiro semestre de 2021. Até 30 de junho, adiantou, foram abertos 65 processos por tráfico e 132 por auxílio à imigração ilegal, números que já ultrapassam o total de registos de 2020 (196, “uma diminuição” face a 2019).

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O “regresso progressivo à normalidade” pré-pandemia, “conjugado com o desemprego” resultante da crise associada, “faz antever uma retoma por parte das organizações criminosas a este tipo de atividade”, corroborou Pedro Soares Santos.

Também orador no debate, o inspetor da Polícia Judiciária sublinhou a necessidade de “dotar as polícias de meios, especialmente humanos”.

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O estado de emergência “parece ter conduzido à redução de certos tipos de crimes”, mas “as organizações criminosas adaptam-se às novas circunstâncias”, destacou, referindo o potencial das “novas tecnologias encriptadas”.

A secretária de Estado da Administração Interna, Patrícia Gaspar, que encerrou o debate, sublinhou também que “as redes se adaptaram rapidamente”, passando para o espaço digital e adotando ferramentas online, servindo-se da tecnologia “para ampliar” o crime, o que coloca “desafios às autoridades”.

O fecho de fronteiras que acompanhou o estado de emergência fez “reduzir significativamente” a utilização de Portugal como país de trânsito para o tráfico e a exploração, constatou Rui Osório, inspetor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, também orador no debate.

Porém, acrescentou, “o setor primário continuou a lucrar e não diminuiu produção”, não tendo havido uma redução de mão de obra no trabalho agrícola, que, sendo “uma atividade muito regulada”, é terreno de “violação constante dos direitos laborais, com ordenados abaixo do razoável” e esquemas de “’dumping’ económico e social”.

“Também os exploradores que se dedicavam à angariação em Portugal viram a sua atividade reduzida e tiveram de se virar para atividades laborais convencionais”, descreveu, realçando que a pandemia “exacerbou as vulnerabilidades” da comunidade imigrante em Portugal.

Também a participar no debate, Fernanda Campos, inspetora-geral da Autoridade para as Condições no Trabalho, reconheceu que os trabalhadores imigrantes têm “dificuldade em saber como mover-se para conseguir apoio”.

Em 2020, a ACT identificou 276 homens e 174 mulheres em situação de tráfico ou exploração laboral em Portugal, sobretudo na agricultura e na construção civil.

Realçando que a ACT tem “uma posição muito privilegiada para detetar indícios de exploração”, a inspetora disse que “todos os inspetores” têm recebido formação sobre estes crimes.

Em Portugal, o tráfico para fins de exploração laboral é o mais sinalizado, com o setor agrícola a liderar a tabela. Traçando um retrato das vítimas em Portugal, Rita Penedo, do Observatório do Tráfico de Seres Humanos, explicou que são maioritariamente homens e adultos.

“Portugal manteve-se principalmente como país de destino de tráfico e exploração laboral”, disse, acrescentando que “as sinalizações de trânsito diminuíram e o tráfico de menores também”, relacionando ambas com o fecho de fronteiras.

Destacando a “invisibilidade forte” das vítimas de tráfico, Rita Penedo alertou para “o risco de não deteção das vítimas ser exponenciado em momentos como o atual.

“As vítimas, grande parte das vezes, não sabem que são vítimas, porque nos países de origem já são maltratadas”, assinalou o procurador Miguel Ângelo do Carmo, realçando que é preciso garantir que os organismos responsáveis são capazes de as identificar e “continuar a trabalhar” para conseguir atingir os traficantes “onde lhes dói mais”, que é no lucro.

“Se houve quem não confinasse foram os traficantes e os exploradores”, fazendo das “vítimas ainda mais vulneráveis”, assinalou Sandra Benfica, do projeto ACT, do Movimento Democrático de Mulheres, reconhecendo que, em contexto de pandemia, “a linha da frente ficou mais difícil, fazendo piorar as respostas”.

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