Saúde

Associação de Bioética alerta para os desafios do Certificado Verde Digital

Notícias de Coimbra com Lusa | 3 anos atrás em 17-03-2021

A Associação Portuguesa de Bioética (APB) alertou hoje para os desafios em matéria de direitos humanos que pode acarretar o Certificado Verde Digital, em discussão na União Europeia para facilitar a livre circulação durante a pandemia.

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“Percebo a importância de retomar a economia, percebo que o tráfego aéreo ser aberto é uma prioridade europeia e mundial, mas a Europa tem uma enorme tradição de proteção dos direitos humanos e implementar medidas inovadoras como o Passaporte Covid ou o Certificado Verde têm de ser equacionadas num quadro de salvaguarda de diretos básicos de cidadania das pessoas”, referiu Rui Nunes.

A Comissão Europeia adotou hoje uma comunicação na qual traça o caminho a seguir com vista a um levantamento gradual das restrições na UE quando a situação epidemiológica da covid-19 o permitir, insistindo na necessidade de coordenação.

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Um dos elementos-chave desta estratégia da Comissão para ‘reabrir’ a Europa no verão é um livre-trânsito digital para comprovar a vacinação, testagem ou recuperação da covid-19, visando retomar a livre circulação, um documento bilingue e com código QR, que Bruxelas quer que entre em vigor até junho.

À Lusa, o presidente da APB, que é também professor catedrático da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, explicou o porquê o foco não poder estar na vacinação, quando o ato de vacinar “não é apenas um ato de liberdade individual”, estando dependente das prioridades de cada Estado.

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“Posso consentir ou não ser vacinado, mas é o Estado que, pelas suas prioridades sociais, determina quem é ou não é vacinado num determinado momento”, frisou.

Colocando o cenário de que se poderá chegar ao verão “sem que uma fatia importante da UE esteja ainda vacinada”, Rui Nunes considerou “inaceitável que de alguma forma exista uma medida discriminatória em relação à mobilidade dessas pessoas”, tendo por base “uma decisão – a vacinação – que não é estritamente pessoal, mas é da sociedade no seu conjunto”.

“Para salvaguardarmos os Direitos Humanos é fundamental encontrarmos outros caminhos”, defendeu o presidente da APB.

Entre esses caminhos, Rui Nunes aponta “a testagem maciça a da população”, sublinhando que esta deve ocorrer “a custo zero” de forma a que “quem não tenha a possibilidade de ser vacinado, possa ter mobilidade na UE”.

O professor catedrático lembrou, ainda, que outras questões éticas e jurídicas se levantam com o chamado Certificado Verde Digital proposto pela Comissão Europeia, nomeadamente no que se refere à proteção de dados dos cidadãos europeus.

“A proposta vai no sentido de que este certificado verde contemple um conjunto alargado de informações sobre as pessoas. É preciso extraordinária cautela: primeiro quem vai tratar estes dados, e em segundo lugar como é que os vai proteger”, questionou Rui Nunes.

O presidente da APB recordou que “a Europa tem uma ferramenta fundamental que é o Regulamento Geral de Proteção de Dados que foi criado precisamente para salvaguardar a privacidade e a intimidade das pessoas e das suas vidas”, defendendo que se implementação do certificado, medida também conhecida como “Passaporte Covid”, “se for para a frente tem de ser preservada a privacidade das pessoas”.

“Tem de se evitar que os dados sejam abusivamente usados para outros fins, algo que acontece dada a apetência de setores da vida empresarial em aceder dados que são apetecíveis para determinação de padrões de consumo ou padrões de saúde e doença”, descreveu.

Outro receio de Rui Nunes é que se abra a porta para que esta medida seja copiada em contextos locais “onde a testagem é mais complexa e difícil”, dando como exemplo entrar num supermercado, num espetáculo cultural ou num estádio de futebol.

Rui Nunes alertou que a ser implementado o certificado verde, todas as questões éticas e jurídicas “têm de ser operacionalizadas e pensadas” porque, defendeu, “não é esta pandemia que deve pôr em causa a conquista civilizacional que distingue a Europa”.

“Temos de encontrar soluções que sejam eficazes do ponto de vista técnico e médico de saúde pública que não conflituem com a marca genética da Europa. A Europa distingue-se por ser o berço dos Direitos Humanos, algo ameaçado em muitos pontos do planeta. Não vamos retroceder o que tanto custou conquistar nas últimas décadas”, concluiu.

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